terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Juízes anulam decretos de Mauricio Macri e restabelecem Lei de Meios

Juíza de San Martín e juiz de Buenos Aires ordenaram medidas cautelares que deixam sem efeito decretos do presidente argentino e reinstauram órgão federal que regula as comunicações

por Opera Mundi


Opera Mundi – Uma juíza federal de San Martín e um juiz federal de Buenos Aires ordenaram nesta segunda-feira (11) medidas cautelares interinas e deixaram sem efeito os decretos do presidente argentino, Mauricio Macri, mediante os quais se deram a intervenção na Afsca (Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audiovisual), a dissolução de sua direção e da própria agência e a modificação das cláusulas antimonopólio da Lei de Meios argentina.

Os dois juízes aceitaram os recursos apresentados por uma cooperativa de comunicação popular e por uma associação de defesa dos direitos do consumidor na Justiça argentina contra os decretos do presidente que miravam a modificação do marco legislatório que regula os meios de comunicação no país.

“De acordo com o disposto pelos juízes Iván Garbarino [de Buenos Aires] e Martina Forns [de San Martín], a Afsca volta a se integrar com o diretório plural presidido por Martín Sabatella, todos os demitidos pela intervenção voltam a seus postos de trabalho, ficam sem efeito todas as medidas tomadas pela intervenção ilegal, se dissolve o Enacom e se retira tudo o que foi disposto pelo interventor Miguel de Godoy”, explicou o diretor nacional de Assuntos Jurídicos e Regulatórios da Afsca, Sergio Zurano.

Em 23 de dezembro, Macri publicou um decreto determinando intervenção estatal de 180 dias para retirar Martín Sabbatella, presidente da Afsca com mandato previsto até 2017, do comando da agência. Miguel de Gogoy, antigo colaborador de Macri e ex-secretário de Meios da Prefeitura de Buenos Aires, foi nomeado interventor no órgão. No dia 04 de janeiro, foi publicado o decreto de Macri que dissolveu a Afsca e a Aftic (Autoridade Federal de Tecnologias da Informação e das Comunicações) e as fundiu no recém-criado Ente Nacional de Comunicações (Enacom), sob o comando do Ministério das Comunicações, além de ter estabelecido mudanças na Lei de Meios argentina, aprovada pelo Congresso em 2009.

Em sua sentença, o juiz federal Iván Garbarino considerou que “não se vislumbram defeitos na lei 26.522 [Lei de Meios] que requerem uma necessária e urgente reparação que não admita a espera de alcançar o consenso e a maioria necessárias que nossa Constituição estabelece para a conversão em lei das modificações pretendidas pelo Poder Executivo nacional.”

O juiz afirmou também que o estabelecimento da Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual, comumente conhecida como Lei de Meios, “foi objeto de um largo debate legislativo e de um profundo estudo judicial”, recordando a série de audiências públicas, debates legislativos e posteriores alterações judiciais que culminaram na sentença da Suprema Corte argentina que considerou a lei constitucional.

Para o juiz, “a modificação normativa pode contribuir à formação de monopólios e oligopólios” no mercado de comunicações argentino, além de ser suscetível a “alterar e/ou afetar os direitos à liberdade de expressão e de acesso à informação de diversos usuários e consumidores”.

Já a juíza federal Martina Forns classificou os Decretos de Necessidade e Urgência (DNU) de Macri como medidas “de caráter arbitrário”. “Considero que resulta evidente e manifesto que com o ditado dos decretos questionados nas presentes, se avançou sobre as competências do Poder Legislativo e se violentou o artigo 165 da lei [de Meios]”. Segundo a juíza, ao intervir na Afsca o governo de Macri desconsiderou “o procedimento legalmente estabelecido e os mais elementares princípios do processo devido aos diretores depostos”, além de ter ignorado “a participação institucional do Congresso da Nação”.


Fonte : Rede Brasil Atual






Reforma trabalhista no Congresso será o desafio em 2016

Analista político do Diap prevê que ataque a direitos da classe trabalhadora troca de lugar com direitos humanos como alvo dos parlamentares conservadores

Escrito por: Luiz Carvalho
Militantes da CUT, em 2015, durante manifestação na capital federal
A agenda que o Congresso Nacional terá pela frente assim que voltar do recesso traz ao menos oito propostas que representam imenso retrocesso para os movimentos sindical e sociais.

São textos que tratam da privatização das estatais, redução da maioridade penal, retirada da Petrobrás como operadora única do pré-sal, estatuto da família, lei antiterrorismo, ataques ao direito da mulher, terceirização sem limites e o estatuto do desarmamento.

Porém, para o analista político do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar) Antônio Augusto Queiroz, o Toninho, o foco da agenda conservadora será mesmo a reforma trabalhista e previdenciária, que parece ganhar cada mais espaço no Executivo.

Para Toninho, sem margens para incentivos e renúncia fiscal, a conta da recessão tende a cair sobre o colo do trabalhador e, além da crise, ele avalia que uma possível saída do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ajuda a tirar da berlinda os temas ligados aos direitos humanos.

Em entrevista ao Portal da CUT, ele alerta que não há outra saída para os movimentos além de definir uma pauta comum e transformar isso em pressão no Congresso, inclusive com exposição dos parlamentares que votarem pela redução dos direitos da classe trabalhadora.

O será prioridade para o Congresso em 2016?

Toninho - Os projetos ligados à Agenda Brasil, aquela organizada pelo Renan Calheiros (PMDB-AL), que tem um viés liberal muito acentuado e alcança diretamente temas de interesse dos trabalhadores. Por exemplo, o projeto da terceirização está neste escopo e será um dos textos sobre o qual vai haver uma pressão muito forte do poder econômico e de alguns parlamentares para que seja votado. Para nós era um assunto que estava sob controle, mas, com a declaração recente do Nelson Barbosa (novo Ministro da Fazenda), falando que a reforma trabalhista está no radar, a estratégia anteriormente montada ficou fragilizada e essa deve ser uma das prioridades no Senado.

O PL das estatais, que cria condições para privatização de empresas públicas como Correios, BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e Caixa Econômica também deve ser prioridade no Senado. Tem também o desafio do combate ao trabalho escravo, já que uma proposta de regulamentação no Congresso caracteriza retrocesso em relação à emenda constitucional. Entra ainda aí o projeto da prevalência do negociado sobre o legislado, tanto no Senado quanto na Câmara, e o governo sinaliza com o envio de uma reforma da Previdência revendo uma série de requisitos para benefícios previdenciários que devem resultar em redução de direitos.

A presidenta Dilma anunciou hoje que essa reforma deve focar, essencialmente, na idade limite para a aposentadoria.

Toninho - Depende de qual idade mínima falamos. A idade média de aposentadoria no Brasil está em 60 anos e querem estabelecer, como regra inicial, 65 anos. Se não houver um generoso processo de transição é retrocesso, sim, porque tem muita gente que começou a trabalhar muito cedo e está próxima de se aposentar. O que caracteriza um contrassenso com a recém-aprovada flexibilização do Fator Previdenciário, para que as pessoas que começaram a trabalhar mais cedo não ficassem condicionadas a uma idade mínima para poder alcançar o fator pleno.

Acho que é muito difícil o governo conseguir limitar o escopo ao aspecto da idade, porque um dos pontos principais cobrados pelo mercado é desvincular o salário mínimo do piso previdencário. O outro é alterar a forma de correção dos benefícios, eliminar a desindexação. Mas eu acho que não há ambiente para aprovar esse tipo de matéria, os movimentos são capazes de brecar essa matéria, que requer mudança na Constituição, e não creio que exista correlação de forças no Congresso para isso.


Então, 2016 será mais desafiador para os trabalhadores do que 2015?

Toninho - Sim, porque o governo está num cenário em que, pressionado pelo mercado e pela ausência de investimento, deve sinalizar com concessões que até um passado recente não faria. O governo tinha margem fiscal para dar incentivos e renúncias até 2014 e, a partir de 2015, vieram medidas que o próprio Executivo parece indicar que não foram suficientes.

Quando o governo fez mudanças, foi em contato com os trabalhadores, o próprio Programa de Proteção ao Emprego (PPE) foi provocado por parte do movimento sindical que queria resolver situações de risco de desemprego.

Enquanto os temas de direitos humanos ficaram mais vulneráveis em 2015 em relação aos trabalhistas, neste ano eles trocam de papel. No ano passado, a despeito de ter um Eduardo Cunha pressionando, você tinha o governo dando sustentação. O Levy (Joaquim Levy, ex-ministro da Fazenda) não tinha autorização para interferir em temas do mundo do trabalho, situação que parece ter mudado. 

Saindo do mundo do trabalho, como você acha que o Congresso receberá outras matérias polêmicas como a redução da maioridade penal e o Estatuto do Desarmamento?

Toninho - O impulsionador dessas mudanças, que representam retrocesso do ponto de vista social e atraso em relação aos direitos humanos, perdeu muita densidade. O Eduardo Cunha era o pilar e a sustentação dessas iniciativas e tudo leva a crer que será cassado ou, no pior cenário, ficará sem grande influência nas matérias legislativas. Com isso, essa agenda tende a perder força. Não há ambiente, nem mesmo na Câmara, para fazer caminhar. Ele exagerou na imposição de seus interesses sobre os comandados. Liderou uma proposta de mudança na maioridade penal, mesmo sabendo que uma postura intermediária, como a mudança no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) teria condições de ser aprovada. Exagerou e se deu mal no processo. Na questão da terceirização pesou a mão para estender até para atividade-fim, tratando também de empregados diretos das empresas, e isso gerou resistência até mesmo no Senado, uma Casa conservadora por natureza, mas que considerou muito radical a proposta da Câmara. Com isso, as propostas ficaram estigmatizadas e teremos maiores perspectivas de segurá-las no Congresso no formato em que saíram da Câmara.

Por outro lado, amplia a possibilidade que as mudanças trabalhistas e previdenciárias se concretizem pela necessidade de reafirmação do ministro da Fazenda e porque o governo assumiu essa bandeira. Mas lembro que, mesmo nos momentos mais agudos da crise, quando o governo propôs as MPs (medidas provisórias) 664 e 665 (que restringiam acesso ao seguro-desemprego e pensão por morte), conseguimos pressionar o Congresso, e nisso a CUT teve papel fundamental, para suavizar os efeitos e até arrancar uma mudança no fator previdenciário favorável aos trabalhadores, Junto com a renovação da política de valorização do salário mínimo.

Você disse que 2015 foi de baixíssima produção parlamentar. Isso se repetirá?

Toninho - Em termos quantitativos, acho que será ainda mais baixa por conta da eleições municipais, por causa da crise e pela ausência de alguém que defina uma agenda, com a provável saída de Cunha. No Senado, o Renan também está vulnerável com a operação lava-jato e, dependendo dos desdobramentos, pode perder força. Mas em termos qualitativos, de repercussão puramente, será mais expressivo do que foi 2015.

Diante desse cenário, qual a saída para o movimento sindical?

Toninho - O caminho é estabelecer unidade no movimento em relação a pautas centrais e, a despeito do governo apoiar propostas no sentido contrário, pressionar para segurar essa matérias. O que poderia ser tirado da agenda pelo Executivo, já foi tirado nas MPs 664 e 665. Ou, se sentir que não há correlação de forças para barrar, a saída é fazer uma negociação para amenizar os efeitos perversos, mas acho que é possível resistir, porque as matérias expõem muito os parlamentares. Flexibilizar direitos na área trabalhista e mexer em direito previdenciário num quadro de pulverização partidária como esse, com divisão grande, com oposição votando contra o que historicamente defendeu para se contrapor ao governo, se houver unidade do movimento sindical, é possível segurar e evitar que os temas do mundo do trabalho sofram retrocesso.

Fonte : CUT - Nacional
André Darros Álvares
Redação Asteca Informa





Nova Tabela do INSS

BENEFÍCIOS: Índice de reajuste para segurados que recebem acima do mínimo é de 11,28% em 2016. O teto previdenciário passa a ser de R$ 5.189,82

Da Redação (Brasília) – A partir de 1º de janeiro de 2016, os segurados da Previdência Social que recebem acima do salário mínimo terão o benefício reajustado em 11,28%. O índice foi divulgado em portaria conjunta dos ministérios da Previdência Social e da Fazenda, publicada nesta segunda-feira (11) no Diário Oficial da União (DOU).

A portaria também estabeleceu as novas alíquotas de contribuição do INSS dos trabalhadores empregados, domésticos e trabalhadores avulsos (veja tabela). As alíquotas são de 8% para aqueles que ganham até R$ 1.556,94; de 9% para quem ganha entre R$ 1.556,95 e R$ 2.594,92, e de 11% para os que ganham entre R$ 2.594,93 e R$ 5.189,82. Essas alíquotas – relativas aos salários pagos em janeiro – deverão ser recolhidas apenas em fevereiro.

O valor mínimo dos benefícios pagos pelo INSS – aposentadorias, auxílio-doença, auxílio-reclusão e pensão por morte –, das aposentadorias dos aeronautas e das pensões especiais pagas às vítimas da síndrome da talidomida, será de R$ 880,00.

O mesmo piso vale também para os benefícios da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) para idosos e portadores de deficiência, para a renda mensal vitalícia e para as pensões especiais pagas aos dependentes das vítimas de hemodiálise da cidade de Caruaru (PE). Já o benefício pago aos seringueiros e seus dependentes, com base na Lei nº 7.986/89, terá valor de R$ 1.760,00.

A cota do salário-família passa a ser de R$ 41,37 para o segurado com remuneração mensal não superior a R$ 806,80 e de R$ 29,16 para o segurado com remuneração mensal superior a R$ 806,80 e igual ou inferior a R$ 1.212,64.

Já o auxílio-reclusão será devido aos dependentes do segurado cujo salário-de-contribuição seja igual ou inferior a R$ 1.212,64.

O teto do salário-de-contribuição e do salário-de-benefício passa de R$ 4.663,75 para R$ 5.189,82.

Os recolhimentos a serem efetuados em janeiro – relativos aos salários de dezembro – ainda seguem a tabela anterior. Nesse caso as alíquotas são de 8% para aqueles que ganham até R$ 1.399,12; de 9% para quem ganha entre R$ 1.399,12 e R$ 2.331,88 e de 11% para os que ganham entre R$ 2.331,88 e R$ 4.663,75.

Tabela de contribuição dos segurados empregado, empregado doméstico e trabalhador avulso, a partir de 1º de Janeiro de 2016

Salário-de-contribuição (R$) Alíquota para fins de recolhimento
ao INSS

até R$ 1.556,94 8%
de R$ 1.556,95 a R$ 2.594,92 9%
de R$ 2.594,93 até R$ 5.189,82 11%
Joana D´Arc da Silva
Departamento de Pessoal da Asteca


O despertar da força

José de Souza Martins - O Estado de S.Paulo.

Numa ponta, um garoto feliz de se reconhecer num boneco negro. Na outra, uma comissão preocupada em exigir o perdão pela escravidão

Muito engano há nas formas de classificação social das pessoas. Nos últimos tempos, ganhou importância a classificação que distingue brancos e negros, com enorme valorização, neste país de mestiços, dos supostamente negros em comparação com os supostamente brancos. Fica aí oculto que um negro, por ser negro, não deixará de ser, também, bonito, culto, inteligente e bom. Mas ninguém se lembrará disso. Nem os negros, vitimados por uma concepção branca da negritude. A cor antes do humano, era coisa de senhor de escravos em relação aos negros.

Crianças, com seus critérios próprios, tem mais facilidade do que os adultos para compreender o verdadeiro sentido dessas classificações. É a sociedade que aos poucos as deforma, impondo-lhes rotulações sociais que expressam mando e poder, em vez de ternura e simpatia. Grande repercussão teve nestes dias que uma mãe tivesse postado na rede a foto da expressão de felicidade do filho Matias, negro, de 4 anos de idade, com o presente que escolhera numa loja, o boneco de Finn, personagem negro de Star Wars, príncipe e herói. Na controvérsia, ninguém se comoveu com o fato de que o menino agiu, simplesmente, como criança. Ele viu na personagem alguém com quem se identificou, na pauta dos valores universais que valem tanto para negros quanto para brancos. Antes de tudo, no brinquedo ele não viu o negro, viu o brinquedo e nele se viu.

Imagem inline 1

Por estes dias, e na outra ponta do acontecimento do menino Matias, a Comissão da Verdade da Escravidão Negra, do Rio de Janeiro, decidiu exigir que o governo brasileiro e o governo do Estado, por lei ou decreto, pedissem perdão pela escravidão imposta aos negros no passado do País. Perdão é, certamente, o item menos relevante da cesta de débitos do Brasil em relação àqueles negros que padeceram no cativeiro. Aqueles que conheceram a infâmia do tronco e do pelourinho e a humilhação da senzala, antes que o labor do eito, pela supressão do escravismo negro, fosse libertado da chibata, tornando-o objeto de liberdade e de contrato.

O governo pede perdão: e daí? Daí que uma comissão preocupada em exigir pedido de perdão pela escravidão negra deixa de lado o essencial da questão: a própria escravidão e o que ela significa. Tivemos a escravidão indígena, abolida em 1755-1757, que era juridicamente diversa da escravidão negra, alimentada pelo suor dos pardos, como eram classificados os índios administrados e seus descendentes, coagidos à sujeição de quem os capturava e possuía. E temos, ainda, a atual escravidão por dívida, nascida no próprio bojo da abolição da escravidão negra. Ela se estende até hoje no campo e na cidade. Os que compreensivelmente querem agora reparos morais, curiosamente não se insurgem contra ela. Na escravidão dos que ainda hoje padecem a escravidão, exigir pedido de perdão sem extinguir o cativeiro é fazer troça de quem cativo é. Por acaso, acabou a luta contra a escravidão?

Quem pedirá perdão pela escravização dos índios, de que decorreu o verdadeiro genocídio que os vitimou? Quem pedirá perdão pela continuidade da servidão atual, na maioria de brancos e pardos e pelos que entre eles, por rebeldia, foram surrados e mortos? Ninguém pensou na questão maior: quem receberá o pedido e concederá o perdão? Perdão, para ser perdão, tem que ter quem o conceda. O acusado não pode perdoar a si mesmo. Seria uma farsa. O que o governo representa não é nem branco nem negro, mas os cidadãos da República. A maioria dos brancos, dos pardos e dos negros, presentes na estrutura do Estado, sequer descende de antigos senhores de escravos. O estado escravista foi o estado monárquico, devidamente punido com a proclamação da República, pela escravidão que legitimou.

De certo modo, está ocorrendo aqui a antinomia apontada por Karl Marx em relação aos judeus da Alemanha: queriam ser judeus e cidadãos alemães ao mesmo tempo, sem perceber que ser uma coisa negava a outra. Descobrindo-se tardiamente como cidadãos de uma cidadania que lhes foi negada durante quase toda a história republicana do Brasil, os negros querem ser cidadãos negros, o que tolhe a cidadania que buscam com razão. O fato de não reconhecerem o mesmo clamor e até o mesmo direito em outros cativos e, portanto, de não fazerem a crítica da escravidão porque se limitam a vê-la e a compreendê-la como mero e injusto castigo do negro, empobrece-lhes a demanda.

Quem explicará isso ao menino Matias? Segundo sua mãe, ele viu a si mesmo no boneco de Star Wars, viu o herói que podia reconhecer, o seu igual e nisso a igualdade que é o fundamento da cidadania.

Postada a foto na internet, houve quem tentasse removê-la, sob o pretexto de que viola o padrão das redes sociais. A denúncia foi recusada. Revelou, no entanto, a mentalidade preconceituosa disseminada ao nosso redor em pequenas ações de veto e censura. Nela, o superficial prevalece sobre o essencial e ameaça todos os Matias, últimos guardiães de uma consciência simples e boa da galáxia dos inocentes.

JOSÉ DE SOUZA MARTINS É SOCIÓLOGO, MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS E AUTOR, ENTRE OUTROS, DE A POLÍTICA DO BRASIL LÚMPEN E MÍSTICO (CONTEXTO)


Fonte : Mensagem eletrônica do Aldo - CPV