quinta-feira, 30 de março de 2017

Coluna do Fernando Neto : A dialética histórica



29/03/2017

Estou pensando um pouco sobre a importância do romance histórico, enquanto a boa leitura. O que ele tem que poderia ser tão importante para a cultura ?

E observo que é, justamente, a reflexão do “personagem universal mediano”, ao transfundo do horizonte onde os vultos históricos surgem e se vão.

Acho que ele se opõe em certa medida ao documental, já que alia os fatos à apreciação subjetiva da sua testemunha, em expandi-los à humanidade de seus olhos, aos anseios de seus sentimentos, ao horror ou ao júbilo, de tais e tais momentos.

Principalmente, o romance histórico prende-se ao real e descreve a história em seu processo histórico a partir da dialética histórica.

É produto do método e elaborado em função da sua teoria do conhecimento.

Mas seria escrito, publicado e lido casualmente? Eu diria que o romance histórico assinala o momento da completude de uma unidade dialética.

Observo, hoje, por exemplo, ao fragmentário das narrativas sem qualquer dialética, obras como o “ O Tempo e o Vento” de Érico Veríssimo e “Os Subterrâneos da Liberdade” de Jorge Amado.

Ao lê-los e relê-los, a unidade dialética de seu contexto está ultrapassada. Mas, é de se notar, apresenta a continuidade que se esboça, como disse, no pensamento do “personagem universal mediano”. Embora plural, ele vai perseguindo o sentido histórico e abre as portas para o “salto dialético”.

Quantas gerações de leitores lerão o romance histórico, que se torne antiquado, sem mais lições imediatas com o futuro ?

Quem leia “Guerra e Paz”, ainda hoje, há de se beneficiar da leitura da obra de Tolstoi, quanto à forma dialética do romance. Mas, nos será mais caro ler do vivido, aqui e agora, quando a verdade desafia a memória a narrar o fato histórico com fidedignidade. 

O romance histórico, refiro-me ao lukacsiano, que vem de Walter Scott, seria, pois, algo sintomático de uma vitória do tempo. Do processo social. E, ao lê-lo, poderíamos crer estar além da documentação fragmentária de heroísmos ambivalentes e bem mais próximo da justiça histórica.

Os romances históricos que temos já são de uma unidade dialética passada, enquanto a presente apenas se iniciaria.

Mais! Sempre há retroações a-dialéticas a tentar dizer a história sem método, mas ao sabor das paixões e do desespero...

Quando eu cotejo o documental com o romance histórico em busca da verdade, imunizo-me da má-fé, das imparcialidades injustas, das opiniões focalizadas. E não me furto de saber da alma humana em sua profundidade.

A fragmentação documental ensaia o romance histórico, faz parte do processo dialético, rumo à síntese e à “negação da negação”, não exatamente sinônimos. Por que se a primeira completa a unidade dialética, a outra parece lançar-se à frente dela para o futuro.

Há algo em certos protagonistas do romance histórico, em tempo de leitura, quando se elabora a violência das crises durante uma pausa. Eles como que não são dessas páginas, mas de páginas futuras, ainda não escritas.

Está a nascer o novo romance histórico em alguns “personagens medianos universais”, que antecipam, desde já, os seus sucessores.

Mas ainda não floresceu a flor, nem amadureceu o fruto. Talvez o próprio gênero literário seja suscetível de transformar-se em outra coisa pela dialética histórica. 

Por enquanto, porém, eu cultuo os bons autores. 

Não seria assim ?

Fernando Neto

PT RJ nº 1741303

Ilvaneri Penteado - Jornalista - Rio de Janeiro


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