segunda-feira, 17 de abril de 2017

Impedir o golpe dentro do golpe


No dia 17 de abril de 2016 ocorreu a mais vergonhosa sessão da Câmara dos Deputados.

Um ano depois, estamos assistindo ao golpe dentro do golpe.

Para impedir isto, é preciso entender o que está ocorrendo.

Erra quem analisa a situação politica atual apenas do ponto de vista da superestrutura, da crise institucional, das denúncias de corrupção, da escalada dos notíciários contra o PT e Lula.

Como em outros momentos dramáticos de nossa história, a situação política expressa um processo econômico e social mais profundo.

Seu pano de fundo é a crise econômica internacional e nacional, que ao mesmo tempo resulta de e também provoca um realinhamento entre as diferentes frações do Capital, dentro e fora do país; e também um realinhamento de forças entre os diferentes Estados, em âmbito mundial. 

Como em outros momentos da história, este realinhamento inclui conflitos militares. 

O ataque dos EUA contra a Síria e as ameaças contra a Coréia do Norte confirmam que a continuidade da crise iniciada em 2008, combinada com o ascenso do populismo de direita, aprofunda os riscos de guerra, as ameaças do imperialismo contra a soberania nacional dos demais países, contra as conquistas democráticas e contra os interesses populares em todo o mundo. 

É neste contexto que ocorreu o golpe no Brasil e vem sendo aplicada a"ponte para o futuro".

O resultado, como não podia deixar de ser, é uma deterioração acelerada dos indicadores econômicos e sociais. 

Ao mesmo tempo, piora a crise política e institucional. 

Isto por vários motivos combinados, entre os quais citamos quatro: 

a) para golpear o PT, foram utilizados pretextos e métodos que ganharam "vida própria". Neste sentido, a situação lembra 1964, quando políticos civis de direita foram alvos da ditadura que eles mesmos fomentaram;

b) o golpe de 17 de abril e 31 de agosto não foi suficiente para destruir o PT e a esquerda, nem tampouco para liquidar a força eleitoral de Lula. Já as forças conservadoras estão com dificuldades eleitorais cada vez maiores, sendo obrigadas (como em 1989) a buscar quem seja ou pareça ser outsider;

c) crescem os conflitos entre as diferentes frações do movimento golpista, inclusive devido ao aprofundamento da crise econômica, a impossibilidade de não "cortar na carne" e o crescente repúdio popular ao governo Temer;

d) as forças conservadoras enfrentam cada vez mais dificuldades de governar o país nos marcos da Constituição de 1988, que por sua vez é o "mínimo aceitável" pelas forças democráticas e populares.

Em todos os terrenos, portanto, o horizonte geral é de tensão crescente.

Para visualizar os possíveis desdobramentos desta situação, é preciso lembrar o que está em jogo, do ponto de vista da classe dominante.

Para eles, para o grande capital, trata-se de ampliar sobremaneira a exploração da classe trabalhadora e aprofundar a internacionalização subalterna de nossa economia. 

Ambos objetivos são incompatíveis com os níveis de liberdades democráticas atualmente existentes. 

É isto que explica o apoio efetivo, prático, da classe dominante à judicialização e à criminalização da política. 

É isto que explica o apoio de Bolsonaro entre certa "elite". 

É isto que explica a ascensão de um Dória.

É por isto que o golpe precisa ter prosseguimento, agora tentando afastar Lula da corrida presidencial, buscando inviabilizar o funcionamento do PT, reprimindo a mobilização social, especulando a adoção do parlamentarismo e -- no limite, embora isto ainda hoje pareça distante -- reestabelecendo aberta tutela militar sobre as instituições.

Aos que se iludem com a atitude predominante entre os militares, lembramos uma frase dita por uma célebre economista filiada ao PT: os democratas são em geral entreguistas, os nacionalistas são em geral fascistas.

Parte da esquerda brasileira ainda subestima o que está em jogo e minimiza os riscos da atual conjuntura. 

O PT é o maior partido da esquerda brasileira. Uma saída pela esquerda exige do PT uma resposta à altura da crise.

Mas a maioria do PT adiou o quanto pode o congresso partidário e tem evidente resistência a debater certos temas de fundo, como a conciliação de classe e a promiscuidade com o grande capital, as alterações em nossa estratégia e programa, as diferenças entre 2018 e 2002, o que fazer se a direita avançar o sinal contra Lula.

Para agravar a situação, o ponto de partida do Congresso do PT -- as eleições diretas realizadas dia 9 de abril -- foram caracterizadas por debate precário, queda na participação e fraudes variadas.

Parte da esquerda, dentro e fora do PT, ainda alimenta expectativas nos mal-denominados "setores progressistas", que no caso em tela são parcelas do golpismo e da classe dominante que estariam supostamente dispostas a tentar colocar o gênio de volta para dentro da garrafa, a pasta dental de volta no tubo.

Fora do PT, parte da esquerda aderiu abertamente ao udenismo e a diferentes variantes de um esquerdismo que parece mais preocupado em derrotar o que chamam de "lulopetismo" do que em derrotar a direita. 

O debate sobre a candidatura Lula, sobre a linha de campanha, sobre o programa de governo, sobre a política de alianças e sobre o que fazer caso a candidatura seja interditada sintetiza os atuais dilemas táticos e estratégicos da esquerda. 

A classe que implementou o golpe não está disposta a aceitar a eleição de Lula em 2018. Não aprendeu nada quem continua acreditando nos compromissos democráticos do grande capital.

A alternativa "tentar cooptar Lula" não está disponível. Entre outros motivos, porque 2018 não é 2002, nem para eles, nem para nós. 

Portanto, a disjuntiva posta para a classe dominante hoje é: ou retirar Lula da disputa ou retirar do calendário as eleições presidenciais de 2018. 

Uma das possibilidades que vem sendo discutida entre as forças reacionárias é a adoção do parlamentarismo. 

Sem o PT, sem o petismo, não há como construir -- no imediato e talvez nem mesmo no médio prazo -- uma alternativa de esquerda para a situação que vivemos. 

Se o PT não quiser ou não conseguir produzir esta alternativa, há dois cenários mais prováveis:

a) a resistência democrática e popular demonstrar força nas ruas, mas não conseguir transformar-se numa alternativa de governo e/ou de poder, fragmentando-se;

b) a resistência democrática e popular ser cooptada por alternativas nacional-populistas (como as que vem sendo vocalizadas, hoje, por Ciro Gomes e Bresser Pereira).

O Congresso do PT precisa ser capaz de formular uma linha de combate para os próximos meses e anos.

Esta linha de combate passa por defender os direitos do povo, fazer oposição radical aos golpistas, lutar para derrotar e derrubar o governo Temer, garantir o mais cedo possível a realização de eleições presidenciais diretas, batalhar para eleger Lula e se preparar para um governo de enfrentamento, cuja síntese política precisa ser a defesa da convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte. 

Esta linha de combate inclui, na hipótese da direita avançar na tentativa de interditar Lula, não cair na armadilha de discutir um "plano B", não reconhecer a legitimidade do processo, convocar a desobediência civil e preparar-se para uma resistência que pode ser mais ou menos dura e prolongada. 

As pré-candidaturas à presidência do PT -- tanto de Gleisi quanto de Lindbergh -- precisam travar a discussão pública sobre estas questões.

E o Diretório Nacional do PT precisa fazer uma operação limpa-trilhos, anulando todas as fraudes cometidas no dia 9 de abril e criando assim as condições para que o Partido se concentre inteiramente no que interessa: 28 de abril, 1 de maio, 3 de maio e as questões expostas anteriormente.

A não ser que se prefira dar milho aos pombos, enquanto o mundo pega fogo.




Postado por Orientação Militante às 10:26

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