A humanidade vive o momento mais difícil de sua história. Nunca antes, como agora, houve uma simultaneidade de eventos que são uma expressão da crise mais profunda que se conhece.
Por Sergio Rodríguez Gelfenstein 07/09/2020 14:59
Sobrecarregados pelo enfrentamento de um cotidiano que se tornou muito agressivo para todos, mas principalmente para aqueles povos aos quais os Estados Unidos declararam guerra, às vezes deixamos de perceber que essa situação inédita se manifesta porque é também a primeira vez que enfrentamos elementos que se relacionam com a crise estrutural da sociedade de classes, que hoje é capitalista, mas que antes era escravagista e feudal.
Em todas elas, as classes privilegiadas tiveram capacidade de superar as crises e até adotar perspectivas revolucionárias e transformadoras, dando lugar a novas formações econômico-sociais que visavam o aperfeiçoamento da exploração.
Nessa medida, o capitalismo não tem futuro, sua fase imperialista tende a ser a parteira de sua própria destruição, como em sua expressão neoliberal, que destrói os próprios fundamentos do capitalismo, incluindo a livre competição e o livre mercado, da mesma forma que o individualismo, o consumismo e o desperdício como testemunhos e afirmação de valores, que podem proporcionar felicidade e sucesso momentâneo, mas não resolvem os grandes problemas da humanidade. Esse é o fracasso deles.
A pandemia do coronavírus foi o símbolo de um fiasco retumbante. Os sistemas de saúde entraram em colapso, mesmo nesses países ricos e desenvolvidos. Mas não é só isso. Ao mesmo tempo, assistimos à destruição do sistema multilateral que, apesar de suas deficiências, vinha proporcionado ao mundo um instrumento de resolução de conflitos e uma estrutura jurídica que evita a anarquia e o caos no planeta.
Da mesma forma, somos confrontados com a possibilidade da guerra, a impunidade dos poderosos, a destruição do planeta como consequência das mudanças climáticas, uma crise econômica de dimensões desconhecidas e novas na história da humanidade.
Como consequência de tudo isso, temos a exacerbação do racismo, da misoginia, da homofobia e da perseguição às minorias, como prática política que cerceia os alicerces da falsa democracia representativa, que é apenas um sofisticado instrumento de dominação de classe, adaptado à modernidade que deu início à revolução francesa.
Nem mesmo os preceitos que a sustentaram e deram relevância a essa revolução burguesa podem hoje ser defendidos pelas elites do poder. Liberdade, igualdade e fraternidade, vendidas ao mundo como panaceia para a nova transformação que se anunciou na França em 1789, após o esmagamento do sistema monárquico feudal, hoje são geringonças que a fúria dos poderosos (não necessariamente dos povos, como seria desejável) está tentando destruir.
Diante disso, um grito de alerta que emerge do pensamento e da voz de Noam Chomsky, respeitado intelectual estadunidense, revela todo o significado do momento: “nunca houve um momento em que viu tamanha confluência de crises (como esta) e as decisões sobre elas têm que ser tomadas muito em breve, e não podem ser adiadas”.
Portanto, quando você resiste e luta em qualquer parte do mundo, você está fazendo, em primeira instância, em defesa da vida no planeta. Hoje, não há tarefa mais revolucionária e mais honrosa do que esta.
*Publicado originalmente em 'Últimas Notícias' | Tradução de Victor Farinelli
Carta Maior
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