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João em caminhada no Elevado Presidente João Goulart |
O jornalista e filósofo João Vicente Goulart, filho do ex-presidente Jango e diretor do Instituto João Goulart, recupera as memórias de um período turbulento do País e rememora fatos da vida pessoal no livro “Jango e Eu - Memória de um exílio sem volta”, lançado pela Civilização Brasileira.
A obra relata o exílio e desenha - com respeito, afeto e convicção - o retrato vivo de seu pai, João Belchior Marques Goulart. O livro mostra um Jango mais íntimo, recolhido e familiar, mas, nem por isso, menos altivo, convicto, democrata e patriota.
Eu conversei com João Vicente, que é meu amigo e com quem divido apreço pelas questões nacionais e o trabalhismo, do qual seu pai foi um ativo militante e líder nacional.
Jango morreu no exílio - impedido de regressar - provavelmente assassinado, em 6 de dezembro de 1976. Portanto, há 40 anos.
“Jango e eu - Memórias de um exílio sem volta” será lançado em Brasília dia 7 (quarta), abrindo a agenda de lançamentos em todo o País. Em São Paulo, será dia 19, às 19 horas, na Livraria da Vila (telefone 3814.5811; site www.livrariadavila.org.br), na rua Fradique Coutinho, 840, bairro de Pinheiros.
Por que escrever o livro
“Há tempos, eu acalentava a ideia de contar nosso exílio, mostrando a rotina opressiva de viver forçado longe da Pátria. Os livros da academia se concentram mais na parte documental e dos arquivos. Faltavam a parte humana, o dia-a-dia no exílio, o monitoramento imposto à nossa vida, as aflições.”
Quarenta anos sem Jango
“Entendo que agora, quando da morte há 40 anos, seria oportuno contar minha experiência, minhas impressões e dizer que, independentemente do provável assassinato, muitas coisas, de alguma forma, ajudaram a matar meu pai - a saudade, a distância, a tristeza, a certeza de que havia sido derrubado por seus compromissos com o povo brasileiro.”
Muitas conversas com o pai
“Transcrevo diálogos inteiros com meu pai, sobre o trabalho no campo, a vida da família, os amigos, o futuro, os contatos com outros exilados, as pressões que foram crescendo no Uruguai e que nos levaram à Argentina.”
Sensação dupla
“Esse tipo de escrita remexe com nossos sentimentos, rememora passagens amargas da época. Mas, ao mesmo tempo, penso que ao escrever o livro pude reencontrar meu pai e reviver com ele aqueles momentos que vivemos juntos.”
Cronologia do exílio
“Embora não seja um livro de história, procuro seguir a cronologia, desde a chegada da família ao Uruguai (João Vicente tinha sete anos), dia 4 de abril de 1964, até o último dia da vida de Jango, em 6 de dezembro de 1976 – ele morreu novo, aos 57 anos (em Mercedes, Província de Corrientes, Argentina). Digo que é um exílio sem volta porque meu pai não pôde voltar mais.”
Sensação de não voltar
“Na medida em que os dias passavam, que não houve as eleições previstas para 1965, mais brasileiros eram exilados e o regime endurecia, meu pai percebia que o golpe não havia sido uma quartelada. Isso aumentava a sensação de que não voltaríamos, que tudo tinha sido planejado de forma meticulosa, que havia um projeto internacional, conforme se viu depois com a derrubada de governos, em efeito dominó, na América Latina.”
Conjuntura e repressão
“Não faço apenas um relato pessoal. Conto que o golpe no Uruguai, em 1973, teve apoio integral do III Exército e muita influência do serviço de inteligência brasileira. Em certa ocasião, meu pai, já no Uruguai há 10 anos, onde trabalhava como produtor rural, renunciou ao asilo político e pediu residência, mas esse pedido foi negado e ele ficou na condição de clandestino.”
Pressão e intimidação
“Por essa época, ele foi chamado a depor no Ministério do Interior, mas não foi, dizendo: - Não vou me apresentar. Não aceitei ser humilhado pelos milicos brasileiros, nem aceitarei aqui. Por isso, seguiu para a Argentina, onde havia a possibilidade do retorno de Peron, com quem meu pai tinha conversado, e lá estavam ex-presidentes argentinos e outros amigos.”
Jango, homem do campo
“No Uruguai, Jango retomou a atividade que havia aprendido com o pai dele, foi criar gado e plantar. Ele tinha hábitos simples, convivia com a peonada. Transcrevo diálogos dele ali, na lida, mostrando sentimentos simples e humanos, porque Jango sempre lutou pelos humildes.”
Risco de sequestro
“Consta que Jango era o quarto listado pra morrer na Operação Condor. Havia risco dos filhos sofrerem sequestro, o que me levou jovem para Londres, aos 19 anos, recém-casado. Quando meu pai faleceu, eu tinha acabado de completar 20 anos.”
Face humana do presidente
“Penso que a imagem que fica do livro é um retrato humano de um homem que lutou pelo Brasil até o final dos seus dias, tentando agregar os amigos no exílio, tentando somar forças para uma abertura no País. Tenho orgulho de meu pai Jango e me sinto feliz por não ser filho de um marechal-presidente, de um vendilhão da Pátria, de um torturador...”
Roteiro para um filme
“Em conversas com o cineasta Roberto Farias, ele me falou da ideia de fazer um filme sobre Jango. Quem sabe, agora, a partir desse livro a gente possa iniciar um roteiro...”
Entrevista por João Franzin, da Agência Sindical
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