domingo, 22 de outubro de 2017

Vida e militância de Candeia são retratadas em musical no Teatro Oficina

Peça biográfica 'É Samba na Veia, É Candeia' apresenta trajetória do sambista e compositor portelense Antônio Candeia Filho e aborda sua atuação contra o racismo e a mercantilização das escolas de samba

por Xandra Stefanel, especial para a RBA 

publicado 18/10/2017 18h11, última modificação 18/10/2017 18h23

OSMAR MOURA/DIVULGAÇÃO

Peça apresenta aspectos cotidianos da vida do músico que fez do samba um instrumento de resistência cultural

Estreia nesta quarta-feira (18) no Teatro Oficina, na capital paulista, o espetáculo É Samba na Veia, É Candeia, realização da Companhia Alvorada e do Coletivo Terreiro de Mauá e produção do Núcleo Coletivo das Artes. Com direção geral de Leonardo Karasek, produção executiva e artística de Rita Teles e texto de Eduardo Rieche, a peça biográfica que fica em cartaz até dia 9 de novembro resgata a trajetória do sambista portelense Antônio Candeia Filho, mais conhecido como Candeia.

A história do compositor será contada em volta de uma roda de samba ambientada entre as décadas de 1960 e 1970. “Não é um musical tradicional, não tem grandes coreografias, não tem gente dançando e cantando toda hora. A maioria dos que atuam não é cantor, é ator. Eles fizeram aulas de canto para se preparar para o musical. Então, na verdade, é uma peça biográfica mais do que um musical, mas não deixa de ser um musical também, porque apresentamos cerca de 20 músicas. A roda de samba é o centro da peça e em volta dela tem cenas da vida do Candeia desde a infância até a morte”, afirma o diretor Leonardo Karasek.

A peça percorre a vida e a obra do sambista dentro e fora dos palcos, desde suas raízes em Oswaldo Cruz e Madureira, no subúrbio carioca, até sua morte, em 1978. Com o ator Marcelo Darlouzi no papel principal, a obra apresenta ao público aspectos cotidianos da vida do músico, a utilização do samba como instrumento de resistência cultural da população negra do subúrbio carioca, sua forma de contestar males sociais como o racismo e a maneira singular de compor.

“No Brasil, as pessoas não têm muitas referências de ídolos do povo preto. O Candeia foi um pioneiro dessas questões no país, de discutir que, mesmo acabada a escravidão, o negro continuava escravo, vivendo na periferia, continuava pobre sem poder ascender econômica e socialmente para ter dignidade como os brancos… Muitas pessoas não conhecem quem foram os militantes negros há quarenta anos. Além dessas questões, teve a militância do Candeia em relação às escolas de samba. A peça tem trechos que falam sobre isso, que antigamente, as pessoas das escolas de samba faziam por amor, no barracão. Esses negros que fizeram a história das escolas por amor – os compositores, aderecistas, cenógrafos – começaram a ser jogados de lado porque os novos profissionais formados nas escolas de Belas Artes levaram a 'intelectualidade acadêmica'. Candeia questionava que as pessoas pretas, pobres e suburbanas foram jogadas de lado”, declara Karasek.

OSMAR MOURA/DIVULGAÇÃO

A roda de samba é o centro da peça e ao redor o grupo apresenta cenas da vida de Candeia, da infância à morte

Durante os ensaios da peça, o elenco discutiu bastante sobre as críticas sociais presentes na obra do sambista e fatos atuais provocados pelo racismo ainda nos dias de hoje foram amplamente debatidos. O caso de Rafael Braga, preso durante os protestos de junho de 2013, no Rio de Janeiro, e o desaparecimento Amarildo Dias de Souza são alguns dos temas que chegaram a ser atualizados na peça, mas que ao final acabaram não entrando por conta da duração da obra. De qualquer forma, o texto denuncia o genocídio e encarceramento de negros no Brasil. “Discussões sobre o racismo reverso, o caso do Rafael Braga, do Amarildo, a morte do povo preto da periferia fizeram parte do nosso processo”, declara o diretor. Para ele, “a arte pode combater o racismo na medida em que ela amplia a consciência e a percepção das pessoas”.

A atriz e produtora Rita Teles também afirma que É Candeia, É Samba na Veia tem papel fundamental na releitura do compositor como crítico dos mecanismos de apropriação cultural dos valores e processos históricos de identidade negra. “Candeia, quando funda o Grêmio Recreativo de Arte Negra e Escola de Samba Quilombo, juntamente com Wilson Moreira e Paulinho Viola, posiciona-se para além da música. Ele não somente se coloca contrário ao processo de industrialização cultural do samba, como enxerga o samba como uma ilha de resistência de valores identitários negros diante desse processo. E, no palco, este lado do poeta Candeia, idealista e militante, se fará presente”, declara.

Segundo o grupo, o Teatro Oficina será utilizado como uma semi-arena, o que possibilita o envolvimento direto do público tanto durante as rodas de samba, quanto nos momentos em que os atores oferecem comes e bebes à plateia, especialmente durante as cenas que se passam no boteco que Candeia frequentava.

Entre as músicas que fazem parte da peça estão Pintura Sem Arte, Testamento de Partideiro, De Qualquer Maneira, Preciso Me Encontrar, sucesso na voz de Cartola, O Mar Serenou, interpretada por Clara Nunes, e Dia de Graça, que estourou com Elza Soares. Também farão parte da encenação composições de parceiros de Candeia, como Riquezas do Brasil, de Waldir 59, Me Alucina, de Wilson Moreira, Falsas Juras, de Casquinha, e Coisas Banais, de Paulinho da Viola.

É Samba na Veia, É Candeia tem direção musical de Edinho Carvalho, trilha sonora, arranjos e direção de Abel Luiz, coreografia de Jefferson Brito e participação da cantora Sueli Vargas.

É Samba na Veia, É Candeia

Quando: de 18 de outubro a 9 de novembro, às quartas e quintas-feiras, às 21h

Onde: Teatro OficinaUzynaUzona

Rua Jaceguai, 520, Bexiga, São Paulo

Quanto: R$ 40 (inteira), R$ 20 (meia-entrada) e R$ 10 para moradores do bairro

Duração: aproximadamente 2 horas

Classificação: 12 anos


Ficha técnica

Direção:Leonardo Karasek
Texto: Eduardo Rieche
Direção musical: Edinho Carvalho e Abel Luiz 
Arranjo musical: Abel Luiz
Preparação vocal: Daisy Cordeiro
Coreografia: Jefferson Brito
Produção: Núcleo Coletivo das Artes Produções
Figurino: Gabriela Rocha
Cenário: Raifah Monteiro
Iluminação: Rodrigo Alves
Ilustração: Bruno Will
Fotos: Osmar Moura
Criação gráfica: Zeca Dâmaso
Assistente de direção: Augusto Vieira
Elenco: Danilo Ramos, Denise Aires, Jair de Oliveira, Jefferson Brito, José Nelson Junior, Josi Souza, Leo Dias, Marcelo Dalourzi, Rita Teles, Suelen Ribeiro, Sueli Vargas, Viviane Clara, Wallace Andrade
Músicos: Brito da Cuíca (cuíca), Danilo Ramos (tamborim), David Silveira (cavaquinho), Didi Carvalho (surdo e percussão geral), Eder Ventura (cavaquinho), Edinho Carvalho (cavaquinho), Hosana Meira (tamborim), Jader Morelo (pandeiro e percussão geral), Jefferson Motta (violão de 7 cordas), Leo Dias (tamborim e pandeiro), Marcelo Glick (atabaque e percussão geral), Marlene Oliveira (prato e faca), Ocimar Dias (agogô), Paulo Novais (bandolim)
Performance: Dan Rodrigo


Rede Brasil Atual

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