sábado, 30 de julho de 2016

Coluna do Fernando Neto : A LIÇÃO DE KUTUSOV


Foto de Fernando Dias Campos Neto.


29/07/2016

Recordo-me que li “Guerra de Paz” de Tolstoi ali por 1965. É, agora, um par de volumes muito envelhecidos na estante.

Eu nem imaginava o que estava por vir, mas hoje sei muito bem da importância daquela obra de Tolstoi, que György Lukács sempre cita no seu “O Romance Histórico”.

Pedro, nome do grande imperador russo, era o mesmo do “personagem universal mediano” a organizar as mediações do cotidiano com o gigantesco das etapas históricas dialéticas.

Refiro-me a Napoleão Bonaparte e Mikhail Kutusov, principalmente o último muito marcado na minha memória.

Muito tempo depois, a mente ainda ingênua, não podia, contudo, deixar de dirigir meu respeito ao comandante russo, mais do que a Napoleão tão bem conhecido de todos.

De vez em quando, penso em sua estratégia espantosa ao entregar Moscou aos incendiários, depois de evacuá-la dos habitantes, à chegada das tropas francesas !

Napoleão acaba por perceber o seu plano e, com a mudança da estação, não teve como não recuar abandonado a cidade.

Ouvidas as suas preces, Kutusov perseguiu os franceses, enquanto eles marchavam contra o “general inverno” morrendo de frio e abandonando a rapina pelo caminho.

Dizia-se que as aves morriam de frio em pleno vôo !

O “general inverno” também foi estratégico para a Rússia, na 2ª Guerra Mundial, mas hoje provavelmente terá muito menos importância.

A acumulação do capital que progride rumo à Moscou, do Báltico até o Mediterrâneo, avançando centrifugamente em sua anarquia de mercado, não se ressente do clima.

Ao levantar os olhos das páginas de Tolstoi, penso com Rosa Luxemburg : “socialismo ou barbárie”.

Moscou, enquanto “terra queimada”, não deixou de ser um espetáculo de barbárie. E ao me perguntar do protagonismo que possa ter o socialista na barbárie, imagino Kutusov, junto ao fogo, esperando e esperando a saída de Napoleão de Moscou.

A retirada do corso também foi barbárie. Ela completou-a, naquela fase histórica.

Seria possível pensar que um assessor local do capital em Moscou seja algo como a ocupação napoleônica da cidade ? O celebrar-se o “fim da história” com más perspectivas ?

Hoje, não seria possível “entregar Moscou” à barbárie do capital, sem estar colaborando com ela. Hoje o capital é um Napoleão que incendeia o mundo todo com ameaças disseminadas e sem volta !

À frase marxista sobre a história quando se repete, já fala da crise estrutural, não da crise cíclica. Da crise que Mészáros observa ser geral, global, permanente, rastejante e sem volta.

E ela se agrava a cada momento ! Eu posso sucumbir aqui diante da tela e ela, sem se repetir em alguma farsa, agrava-se e agrava-se, independente da participação do socialista que adverte dela. Que dela adverte e adverte.

Seria assim ?

Fernando Neto


Ilvaneri Penteado - Jornalista - Rio de Janeiro


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