terça-feira, 19 de julho de 2016

JUÍZA FEDERAL REDUZ PELA METADE JORNADA DE TRABALHO DE SERVIDORA PÚBLICA QUE É MÃE DE AUTISTA


A Juíza Federal DRA. PAULA MANTOVANI AVELINO, atendendo pedido profere sentença de mérito e autoriza que uma servidora pública federal lotada na UNIFESP – Universidade Federal de São Paulo, possa ter sua jornada reduzida pela metade para poder cuidar de seu filho que é autista.

Em seu despacho liminar a juíza aponta que: “No presente caso, aduz a autora que é servidora pública federal, auxiliar de enfermagem, com jornada de 40 horas semanais, lotada na Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP e que possui um filho menor portador de Autismo. A autora alega que seu filho necessita de cuidados constantes e a tem como única cuidadora, não possuindo meios de custear o serviço de profissional especializado para tanto. Afirma que protocolou requerimento administrativo pleiteando a redução da sua carga horária com base no Decreto Legislativo 186 que aprovou o texto da Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiência e nos artigos 1º, III, 226 e 227 da Constituição Federal, concluindo a perícia médica realizada no âmbito do processo administrativo ser o menor portador da enfermidade CID 10 – F 84.0 – Autismo Infantil, após o que foi dado parecer favorável à concessão de horário especial, mas mediante compensação de horário a critério da chefia. Sustenta a autora que a solução de redução da carga horária mediante compensação posterior é uma resposta prejudicial aos interesses da criança com deficiência, uma vez que não atende aos objetivos traçados pela constituição. 

A União, em contestação, alega preliminarmente a impossibilidade jurídica do pedido em face do óbice legal disposto nos artigos 98, 3º e 44, II da Lei 8.112/90 e no mérito que a autora pleiteia a redução na carga horária devido à deficiência de seu filho, todavia, sem querer se submeter aos ditames legais da compensação do horário ou redução dos vencimentos em detrimento da supremacia do interesse público sobre o particular. Pois bem. O óbice legal apontado pela União como preliminar se confunde com o mérito da demanda, de modo que passo a analisá-lo. A possibilidade de realizar horário especial pelo servidor público federal se encontra regulada pela Lei 8.112/90. Senão vejamos: Art. 98 (…) 2º Também será concedido horário especial ao servidor portador de deficiência, quando comprovada a necessidade por junta médica oficial, independentemente de compensação de horário. 3º As disposições do parágrafo anterior são extensivas ao servidor que tenha cônjuge, filho ou dependente portador de deficiência física, exigindo-se, porém, neste caso, compensação de horário na forma do inciso II do art. 44. 

Nesse contexto, a discussão dos autos cinge-se à redução da carga horária para fins de acompanhamento de tratamento médico do filho menor portador de deficiência independentemente de compensação de horário. A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência foi promulgada pelo Decreto 6.949/09, sendo a única até o momento a possuir status de emenda constitucional, nos termos do art. 5º, 3º da CF. Dessa forma, no caso concreto deve ser dada interpretação do dispositivo da lei ordinária de modo a conferir maior efetividade ao direito fundamental. Nesse sentido, há que se ressaltar o trecho do acórdão proferido nos autos da ADI 5240: Esse caráter supralegal do tratado devidamente ratificado e internalizado na ordem jurídica brasileira – porém não submetido ao processo legislativo estipulado pelo artigo 5º, 3º, da Constituição Federal – foi reafirmado pela edição da Súmula Vinculante 25, segundo a qual é ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito. Tal verbete sumular consolidou o entendimento deste tribunal de que o artigo 7º, item 7, da Convenção Americana de Direitos Humanos teria ingressado no sistema jurídico nacional com status supralegal, inferior à Constituição Federal, mas superior à legislação interna, a qual não mais produziria qualquer efeito naquilo que conflitasse com a sua disposição de vedar a prisão civil do depositário infiel.

Pautando-se em farta jurisprudência e também no direito internacional, ela prossegue: “Tratados e convenções internacionais com conteúdo de direitos humanos, uma vez ratificados e internalizados, ao mesmo passo em que criam diretamente direitos para os indivíduos, operam a supressão de efeitos de outros atos estatais infraconstitucionais que se contrapõem à sua plena efetivação. (ADI 5240, Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgamento em 20.8.2015, DJe de 1.2.2016)Saliente-se que, se para o servidor portador de deficiência o dispositivo da lei 8.112/90 confere o direito de realização de horário especial sem a necessidade de compensação posterior, no caso dos autos, condicionar o direito à realização de horário especial à posterior compensação ou redução do salário não me parece compatível com os preceitos da Lei 7.853/89 e da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência promulgada pelo Decreto 6.949/09 que tem como princípio 

O respeito pelo desenvolvimento das capacidades das crianças com deficiência e pelo direito das crianças com deficiência de preservar sua identidade, dispondo, ainda, o Artigo 7:Crianças com deficiência 1. Os Estados Partes tomarão todas as medidas necessárias para assegurar às crianças com deficiência o pleno exercício de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, em igualdade de oportunidades com as demais crianças. 2. Em todas as ações relativas às crianças com deficiência, o superior interesse da criança receberá consideração primordial. De acordo com o laudo médico de fl. 18, o filho da autora recebeu o diagnóstico de CID F84.0 (Autismo), apresentando sintomas de agitação e estereotipias, além da extrema dificuldade de interação social e alterações no comportamento, sendo sugerido acompanhamento multiprofissional (psicólogo, fonoaudiólogo, psiquiatra, terapia ocupacional, etc) por tempo indeterminado, o que foi confirmado na inspeção realizada pela UNIFESP (fls. 19/20) que, inclusive, deferiu o pedido da autora no processo administrativo condicionado, contudo, à compensação posterior de horário a ser estabelecida pela chefia imediata da autora (fl. 21).Desta forma, de modo a possibilitar o desenvolvimento das capacidades do menor e por consequência sua interação social, entendo ser razoável a redução da jornada da servidora de 40 horas semanais para 30 horas sem compensação posterior ou diminuição salarial, uma vez que esta é a única cuidadora da criança. DISPOSITIVO. 

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido e extingo o processo com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC) para reconhecer o direito à redução da jornada de 40h para 30h semanais sem necessidade de compensação posterior de horário ou redução salarial”.

(*) Processo que tramita na 4ª VARA FEDERAL DE GUARULHOS, sob n. 0005493-84.2015.403.6119 , a cargo do escritório APARECIDO INÁCIO E PEREIRA ADVOGADOS ASSOCIADOS

Boletim Informar Jurídico


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