sábado, 27 de agosto de 2016

O crime de Macri se consumou no Brasil

A offshore Fleg, empresa de Mauricio Macri, esteve envolvida no delito investigado pelo promotor Delgado, e se articulou no Brasil com outras duas empresas

Martín Granovsky, para o Página/12


A causa contra Mauricio Macri por um suposto esquema de lavagem de ativos através das suas empresas offshore avançou mais um importante degrau. O promotor Federico Delgado tirou as primeiras conclusões sobre a empresa Fleg, a sociedade radicada em Bahamas cujas negociatas vem sendo reveladas pelas reportagens do Página/12 desde abril. Delgado afirmou que “a causa já mostra que a Fleg foi uma empresa que originou outras empresas”.

No escrito levado ao juiz Sebastián Casanello, o fiscal sustenta que “a esta altura do processo, é possível precisando os caminhos que devemos percorrer, com cada vez mais precisão”.

Um dos caminhos é o indicado: que a Fleg foi uma “empresa-mãe”.



Outro dos caminhos que deve ser seguido, segundo o acusador, é o de “buscar a relação entre a Fleg e a Owners, como duas caras de uma mesma moeda”.

O terceiro caminho surge desta frase do promotor: “finalmente, temos que determinar se a Owners, a Fleg e a Socma Americana constituem uma tríade criada para ocultar uma só identidade econômica, sendo mais que simplesmente sócias”.

Segundo o escrito “essa tríade começou a se gestar nas Bahamas e foi aperfeiçoada no Brasil”.

O verbo “aperfeiçoar”, no jargão jurídico argentino, significa dizer que o suposto delito investigado pela promotoria teria sido consumado na etapa brasileira da triangulação.

O escrito também se refere diretamente ao enunciado do processo: “Macri, Mauricio s/infração art. 303”. A primeira parte do artigo 303 do Código Penal argentino estabelece que será “reprimido com prisão de três a dez anos e multa de duas a dez vezes a quantia da operação, aquele que converter, transferir, administrar, vender, gravar, dissimular ou colocar em circulação no mercado, de qualquer outro modo, bens provenientes de um ilícito penal, com a consequência possível de que a origem dos bens adquiram a aparência de um ilícito”.

O fato de o promotor ter invocado esse artigo significa que sua pesquisa poderia se ajustar a esse tipo penal, e sobre ela vem desenvolvendo seu trabalho.

Quando o processo fala da gestação do esquema nas Bahamas, se refere à criação da Fleg, com Mauricio Macri no diretório junto com seu pai, Franco Macri.

Com relação à consumação do crime, o escrito de Delgado diz que “a relação entre a Owners, a Fleg e a Socma Americana se conformou no Brasil e se cristalizou num prazo relativamente curto, durante o mês de setembro de 1998”. O verbo “cristalizar”, neste caso, se aplica às ideias, aos sentimentos ou aos desejos de uma pessoa ou de uma coletividade, e significa “tomar forma clara e precisa, perdendo sua indeterminação”.

Assim, a Fleg teria sido o primeiro passo de um esquema que se consolidou com a criação de sociedades no Brasil.

Após analisa os indícios apresentados pelo deputado Darío Martínez, o promotor Delgado passou a utilizar os dados para construir sua própria descrição de como sucederam as coisas. Diz ele, sem verbos condicionais, que a Socma Americana cobrou nove milhões de dólares por parte da Fleg, em troca de 99% das ações da Owners do Brasil. Lembremos que a Fleg se tornou acionista majoritária da Owners no dia 21 de setembro de 1998.

Depois, em outubro de 1998, a Socma Americana “constituiu outras três sociedades novas, e realizou investimentos em dinheiro em cada uma delas”. As empresas são: Partech-Unnissa (investimento de 1,89 milhão de reais), Partech (5,54 milhões de reais, em negócio que também envolveu a offshore Equifax, das Ilhas Cayman) e Itron do Brasil (3,42 milhões de reais).

Por sua vez, a Owners se relaciona com outras três novas firmas, também segundo o escrito do promotor. Um delas é a Martex do Sul, formada em 1999, com capital inicial proveniente da Socma Americana. Em 2007, a Owners-Fleg se uniu à Martex. Outra empresa, formada em 2002, é a Mega Consultoria, que também se envolveu com a Owners-Fleg no mesmo ano.

O resumo escrito por Delgado diz que “da tríade Fleg-Socma Americana-Owners se constituíram três sociedades pelo lado da Socma Americana (Partech-Unnisa, Itron do Brasil e Partech), enquanto a Owners se incorporou a outras três sociedades (Martex do Sul, Mega Consultaria e Itron do Brasil)”.

O mistério a ser revelado, segundo o promotor, é que “há nove milhões de dólares em jogo nesse esquema, cuja origem devemos descobrir”.

“Esses atos de comércio nos quais se objetivou a relação da tríade deveriam estar registrados no país vizinho, e, na atual etapa devem apontar, este é o alvo que deve ser buscado pelos trabalhos, os quais devem ser orientados a solicitar a informação vinculada às sociedades em relação a todos os registros de sociedades, movimentos bancários e informação fiscal”.

O objetivo imediato do fiscal: enquanto as chancelarias e o Poder Judiciário da Argentina e do Brasil intercambiam despachos – um sistema no qual o promotor Federico Delgado confia pouco, porque afirma que em vez de responder pedem mais informações –, o juiz Sergio Casanello, responsável pela causa, poderia pedir a colaboração do Corpo de Peritos Contadores da Justiça Nacional, para que examinem a documentação agregada ao processo, para apontar se o Grupo Macri assentou a saída de 9,3 milhões de dólares com o objetivo de constituir a Fleg, e se, de alguma maneira, se registrou a relação entre a Fleg, a Owners e a Socma Americana na AFIP (equivalente na Argentina à Receita Federal).

Tradução: Victor Farinelli

Créditos da foto: Wikimedia Commons


Carta Maior

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