terça-feira, 7 de março de 2017

Sexismo no trabalho: profissionais ainda enfrentam discriminação de gênero



Aproveitando o ensejo da comemoração do Dia Internacional da Mulher, em 08 de Março próximo, vale refletir sobre o sexismo no trabalho, fenômeno, infelizmente, ainda comum nos dias de hoje. O termo “sexismo” representa o conjunto de preconceitos e discriminações que se baseiam no sexo ou na orientação sexual. Geralmente, a pessoa discriminada é colocada em posição inferior, somente por causa da sua identidade sexual. O que se observa com mais frequência na sociedade é a associação do sexismo à posição que o machismo determina para as mulheres. Mas também pode ser relacionado ao tratamento preconceituoso conferido aos homens, aos homossexuais, aos transgêneros, aos que não se identificam com nenhum dos gêneros, entre outras formas de representação de identidade sexual. A discriminação contra mulheres é definida como “machismo” ou “misoginia”, enquanto o preconceito contra homens é chamado de “misandria”.

Nos processos seletivos de profissionais para vagas de emprego e em várias organizações, é comum o surgimento de frases como: “babás, cozinheiras e empregadas domésticas são profissões para mulher” ou “caminhoneiros, pedreiros e vigilantes são profissões masculinas”. Tanto que os próprios anúncios de emprego já definem o sexo da pessoa que vai se candidatar à vaga, como, por exemplo, em: “Vagas para caminhoneiros”. Existe também uma crença de que “mulheres não têm competência para ocupar cargos de gestão nas empresas” ou “mulher no escritório é excelente só na hora de servir o cafezinho”. Pensamentos como estes já estão tão enraizados no mundo do trabalho a ponto de criar injustiças e abusos, como diferenças salariais para profissionais que exercem a mesma função, obstáculos para conseguir promoções, rebaixamento profissional, assédio moral e até mesmo assédio sexual. Essas frases preconceituosas, arraigadas no inconsciente coletivo e na cultura de uma sociedade, são manifestações do sexismo no ambiente de trabalho.

São também bastante comuns as atitudes discriminatórias em relação a trabalhadores e trabalhadoras homossexuais, vítimas da homofobia, até mesmo no mercado de trabalho. Por outro lado, engana-se quem pensa que o homem não é vítima de discriminação de gênero. Não é comum, mas acontece.


Nesta NJ Especial que abre a semana da Mulher, faremos uma reflexão mais abrangente sobre a presença da condição feminina, masculina e da homossexualidade no mundo do trabalho. Isso porque a luta da mulher foi pioneira e serviu de inspiração para que outros trabalhadores, também discriminados em razão do sexo, conquistassem seu espaço. Veremos seis casos julgados na Justiça do Trabalho mineira envolvendo discriminação de gênero e acompanharemos projetos colocados em prática, com a finalidade de combater atitudes sexistas no ambiente de trabalho.

Mulher ainda enfrenta discriminação no mercado de trabalhoNão há dúvidas de que as mulheres evoluíram muito em sua trajetória de superação da cultura machista e patriarcal e na conquista do merecido espaço no mercado de trabalho. Hoje elas exercem profissões que antes eram reservadas aos homens, como, por exemplo, as de motorista de caminhão, policiais, segurança e profissionais da construção civil. Essas eram profissões tipicamente masculinas porque exigem força física e envolvem violência. No entanto, cada vez mais a sociedade se rende à competência profissional feminina, reconhecendo que a mulher conta com armas poderosas, como inteligência, delicadeza, técnica e até, para muitas, um bom preparo físico mesmo, para apagar a velha imagem do sexo frágil. Nesse sentido, a luta da mulher trabalhadora se confunde com a própria história do Direito do Trabalho.


Mas, apesar das grandes conquistas, as ações ajuizadas na Justiça do Trabalho mineira revelam que a mulher moderna ainda enfrenta discriminação no mercado, em relação aos níveis salariais observados nas empresas. São práticas patronais que violam o artigo 7º, XXX, da Constituição Federal, o qual proíbe diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão, por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.

Mulher contratada como “guardiã” consegue na Justiça equiparação salarial com vigilante do sexo masculinoUm exemplo que ilustra bem essa conquista de novos espaços antes dominados somente por homens é a ação julgada pela juíza Júnia Márcia Marra Turra, em sua atuação na 14ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte. A empregada relatou que prestou serviços como segurança nas dependências do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Suas principais funções eram atender e escoltar magistrados e desembargadores. Em sua ação, a trabalhadora denunciou que colegas do sexo masculino recebiam salários maiores para desempenhar as mesmas atividades. Por isso, ela postulou a condenação da empresa de segurança ao pagamento das diferenças salariais decorrentes da equiparação com um colega do sexo masculino, indicado como paradigma (termo utilizado para designar o colega indicado pelo empregado na ação judicial em que pleiteia equiparação salarial).

Em sua defesa, a empregadora sustentou que o profissional homem, indicado como paradigma, ocupava o cargo de vigilante, com atribuições diferentes da profissional mulher, cujo cargo era denominado guardiã. Acrescentou a empresa que o paradigma desempenhava função destacada no TJMG, integrando grupo de selecionados vigilantes, que tinham como função principal atender e escoltar magistrados e desembargadores, enquanto aos demais vigilantes e guardiãs incumbia somente a guarda patrimonial da instituição.

Em sua sentença, a magistrada explicou que os critérios para a concessão da equiparação salarial estão previstos no artigo 461, e seus parágrafos, da CLT. De acordo com esse dispositivo legal, o empregado que requer a equiparação tem o ônus de provar que desempenha função idêntica à do paradigma indicado, trabalhando ambos para o mesmo empregador, na mesma época e localidade. À reclamada incumbe a prova dos fatos que impedem o direito alegado pelo empregado, o que, no caso, são: níveis diferentes de produtividade ou de perfeição técnica no trabalho de ambos, diferença de tempo de serviço superior a dois anos em favor do paradigma, a existência de quadro de carreira na empresa, ou ainda que o paradigma foi designado para a função em decorrência de readaptação previdenciária.


A partir da análise do conjunto de provas, a julgadora constatou que, na prática, vigilante e guardiã exercem as mesmas funções, conforme declarou a própria testemunha da empresa. Ou seja, apesar de haver diferença de denominação dos cargos ocupados pelos profissionais do sexo masculino e feminino, não existe diferença de atribuições. Sendo assim, o único detalhe que diferenciava os cargos e, em consequência, determinava o pagamento de salário inferior ou superior, era a classificação dos profissionais de acordo com o sexo.



Mas, para a magistrada, é irrelevante a denominação que a empregadora conferiu aos cargos, pois o que importa é a realidade vivenciada pelas partes, a qual deve prevalecer sobre meras formalidades. Assim, uma vez comprovado que a guardiã sempre exerceu suas atividades em igualdade de condições em relação ao colega homem, recebendo, porém, remuneração inferior à dele, a juíza sentenciante condenou a empresa de segurança ao pagamento das diferenças salariais postuladas, apuradas mês a mês, além dos respectivos reflexos. O TRT de Minas confirmou a sentença. (Processo nº 00484-2007-014-03-00-8-RO).

JT julga caso de bancária discriminada e dispensada simbolicamente no Dia Internacional da MulherUma bancária procurou a Justiça do Trabalho relatando que foi vítima de rebaixamento profissional, tendo sido dispensada por justa causa no dia 08/03/2011, ou seja, exatamente no Dia Internacional da Mulher. Mera coincidência? Não, afirmou o juiz Francisco José dos Santos Júnior, que julgou o caso na 1ª Vara do Trabalho de Divinópolis. Após examinar o conjunto de provas, ele ponderou: “Tudo isso faz crer que a dispensa da reclamante exata e simbolicamente em 08/03/11, Dia Internacional da Mulher, de fato não foi por acaso, mormente porque, pela tese de defesa, poderia a dispensa ter ocorrido antes ou depois”.

O magistrado examinou o conteúdo das transcrições da conversa contida nos CDs juntados ao processo pela bancária. Para ele, ficou comprovado que o assédio moral teve início com a tomada da superintendência onde atuava a bancária pelo colega, que é um dos réus no processo. Depois disso, o juiz observou que vieram as pressões para que a trabalhadora deixasse o cargo de gerente de negócios, já há muito por ela ocupado, com rebaixamento de função para escriturária, intento alcançado pelo assediador. As outras irregularidades identificadas pelo julgador referem-se à redução salarial, estornos de créditos bancários e nítida intenção de alcançar a dispensa por justa causa da bancária.

Ao examinar o conteúdo das transcrições da conversa contida nos CDs, o juiz verificou que a sequência de falas entre o réu e a bancária deixa clara a intenção do primeiro de retirar a empregada da superintendência regional, onde já atuava há um tempo, considerando que ela não expressava, aos olhos dele, conhecimento para agregar ao grupo. “O que noto da conversa é o intento de desmotivar, em sequência de apontamento de vazios profissionais com o claro intuito de que a demandante deixasse o cargo de gerente de negócios, o que acabou ocorrendo”.

Segundo o juiz, houve também insinuações do réu no campo da avaliação de desempenho da bancária, em nítido tom de ameaça de que ela seria prejudicada com a inserção de dados avaliativos não positivos no sistema do banco, caso ela não deixasse o cargo de gerente de negócios. O julgador somou a isso a inexplicável referência do superintendente à condição de mulher da bancária, durante sua conversa com ela, transcrita no processo. Ele destacou o seguinte trecho: “Acho e, por favor, te peço que em qualquer circunstância ali fora você reserve isso, né? Eu não acho que seja uma função que encaixe legal na pessoa de uma mulher. […]”.


Conforme enfatizou o julgador, a conversa transcrita aconteceu em 08.03.04, tendo o réu até mesmo feito referência sem o menor sentido (a não ser por sua visão machista) ao Dia Internacional da Mulher durante o diálogo. Na percepção do magistrado, o conteúdo desse diálogo faz crer que a dispensa da bancária foi planejada para acontecer simbolicamente em 08/03/11, Dia Internacional da Mulher. Para ele, sinaliza no mesmo sentido o fato de que, após a saída da bancária da superintendência, ali permaneceram trabalhando apenas homens, como destacou um informante. “Essa mesma postura machista muito explica a pressão sofrida pela reclamante para que deixasse o cargo de gerente de negócios, postura inaceitável em qualquer tempo, muito menos nos dias de hoje, no qual todo o nosso ordenamento jurídico busca incessantemente inserir e valorizar a mulher no mercado de trabalho”, ponderou o juiz, acrescentando que a apuração interna feita pelo banco também trouxe traços de como o superintendente ultrapassava os limites do poder diretivo e disciplinar que detinha.


Por fim, como resultado disso tudo, a bancária perdeu comissão e teve redução salarial e estornos indevidos, arrematando, com a sua dispensa por justa causa, o quadro de episódios que levaram à marginalização profissional da trabalhadora, com afetação da saúde dela. Tudo isso, segundo o magistrado, caracteriza nítido assédio moral. Os valores das indenizações deferidas pelo juiz sentenciante totalizam mais de 60 mil reais. O TRT mineiro manteve a condenação. (Processo nº 00917-2011-057-03-00-0-RO).

Mulher na Construção Civil: JT-MG concede indenização a trabalhadora que não tinha acesso a banheiro feminino e sofria assédio sexualCimento, tijolos, concreto, poeira. Elementos que não combinam com a fragilidade, a vaidade e a delicadeza feminina? Nada disso! “Lugar de mulher é onde ela quiser”, proclama o novo slogan que sintetiza a luta pela igualdade e simboliza a nova geração em que se destaca a “Mulher em Construção”, nome dado a uma ONG do Rio Grande do Sul. Atualmente, a ideia dessa bela iniciativa gaúcha já se espalhou pelo Brasil e ações semelhantes já foram adotadas, inclusive, em Contagem (MG). Esse vídeo, produzido pela TVE-RS, mostra como funciona o projeto que busca capacitar mulheres para o trabalho na construção civil, jogando uma pá de cal sobre outra antiga frase machista, também muito conhecida: “Lugar de mulher é na cozinha”. É um projeto social que incentiva mais do que a qualificação profissional. Desperta a consciência de que é possível a construção de um futuro mais promissor, livre da discriminação de gênero.


Entretanto, enquanto essa realidade está ainda um pouco distante, a Justiça do Trabalho mineira continua recebendo ações de trabalhadoras da construção civil, que denunciam nítido sexismo no local de trabalho. Exemplo disso é a ação julgada pela juíza Maria Irene Silva de Castro Coelho, na 1ª Vara do Trabalho de João Monlevade. Ao analisar os fatos e provas do processo, a julgadora constatou que uma empresa de engenharia não disponibilizava banheiros femininos e em boas condições de higiene nos locais de trabalho e, ainda, que a empregada, operadora de pá carregadeira, sofria assédio sexual por parte de um superior hierárquico. Diante disso, a julgadora condenou a empresa ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$10 mil. A decisão foi confirmada pelo TRT-MG.

Depoimentos de testemunhas revelaram que, além de os banheiros químicos oferecidos ficarem distantes do canteiro de obras, não eram destinados ao público feminino e a limpeza deles era precária. E eram várias as mulheres trabalhando no canteiro de obras.

Além disso, uma testemunha apontou já ter presenciado a trabalhadora ser constrangida no local de trabalho por ter sido assediada pelo encarregado. Ela contou que este já teria indagado a respeito da colega, tendo afirmado que se a pressionasse ficaria com ele por medo de perder o emprego. O chefe comentou que estava insistindo, mas a empregada estava “se fazendo de difícil”. Segundo a testemunha, mesmo comentando que a reclamante era casada, o encarregado insistiu no assédio.

Quanto à inexistência de banheiros femininos, a magistrada explicou que a conduta afronta a NR-24, item 24.1.2.1, do Ministério do Trabalho e Emprego. “Incumbe ao empregador fornecer ao trabalhador todas as condições para o desenvolvimento de seu mister, e, ainda mais, daquelas que atingem diretamente a preservação de sua intimidade”, destacou na sentença, acrescentando que a separação de banheiros por sexo decorre de obrigação legal, que não pode ser negligenciada pelo empregador. Para a julgadora, a situação vivenciada pela reclamante implica dano moral indenizável.

Da mesma forma, ela reconheceu que o tratamento inadequado recebido do superior hierárquico causou dano moral à reclamante e este deve ser reparado: “Trata-se de situação constrangedora e humilhante, que violou a sua integridade psíquica, vilipendiando direitos da personalidade, como liberdade sexual, honra, imagem, vida privada, intimidade e dignidade pessoal e profissional”, registrou na sentença.

Por esses fundamentos, a juíza deferiu à trabalhadora uma indenização de R$10 mil pelos danos morais sofridos. A decisão foi confirmada em 2º grau. (O número do processo foi omitido para preservar a privacidade das pessoas envolvidas) .

Discriminação masculina: empresa de cosméticos terá que indenizar empregado que não foi promovido a gerente por ser homemÉ comum a discriminação da mulher, de homossexuais e dos transexuais no mercado de trabalho, que ainda é dominado por profissionais do sexo masculino. Estes, geralmente, recebem os melhores salários e ocupam mais cargos de gestão. Mas você já viu alguém ser discriminado no trabalho pelo fato de ser homem? É um caso raro de “misandria”, nome dado a esse tipo de preconceito.


A 7ª Turma do TRT-MG se deparou com essa rara e inusitada situação ao analisar o caso de um trabalhador que não conseguiu preencher o cargo de gerente de uma empresa por ser homem. “Não há dúvidas de que a atitude da reclamada causou frustração, decepção e tristeza ao reclamante, que não teve a oportunidade de ascender na empresa, máxime por motivo injustificável”, acentuou a juíza convocada Sabrina de Faria Fróes Leão, relatora do recurso da empresa especializada em produtos de beleza.

A ré não se conformou com a sua condenação ao pagamento de indenização por danos morais, argumentando que as alegações do trabalhador não ficaram provadas. Até porque, afirmou, as declarações da testemunha indicada por ele não demonstraram a ofensa a direito da personalidade do ex-empregado, tendo em vista que o conteúdo do depoimento revela apenas a intenção de favorecer o reclamante.

Entretanto, para a relatora ficou claramente demonstrado que a empresa discrimina os seus empregados do sexo masculino no processo de seleção para o cargo de gerente. “O procedimento é odioso e viola o art. 5º, caput, e inciso I, da CR/88, que vedam a discriminação em razão de gênero”, asseverou a magistrada. Ela considerou firme e convincente o depoimento da testemunha, por meio do qual, na sua visão, foi possível identificar a discriminação masculina, pois a testemunha deu a conhecer que havia discriminação de sexo para se exercer a função de gerente, sendo que apenas mulheres eram promovidas a este cargo.

A testemunha apresentada pelo empregado declarou que os homens não podiam ocupar oficialmente o cargo de gerente e, por isso, ele foi preterido entre os candidatos ao posto. Esse impedimento, segundo a testemunha, era de conhecimento de todos na empresa, sendo, inclusive, mencionado abertamente pela gerente.

Para a julgadora, essa prática empresarial fere o princípio isonômico e demonstra evidente discriminação sem explicação razoável, de modo a segregar o empregado do sexo masculino a determinado posto no local de trabalho, o que é injustificável, pois, na sociedade moderna, não faz mais sentido a separação entre tarefas masculinas e femininas. “Note-se que não há nenhum elemento nos autos que justifique a discriminação de gênero no cargo de gerência da empresa”, completou.


Diante da constatação da prática discriminatória em razão de gênero, a 7ª Turma do TRT mineiro decidiu manter a sentença que condenou a empresa de cosméticos ao pagamento de uma indenização por danos morais no valor de 7 mil reais. (Processo nº 0001684-70.2013.5.03.0106-ED).

Liberdade de gênero e de orientação sexual: vencendo preconceitos no trabalhoA questão da sexualidade deveria, em tese, ficar restrita ao âmbito dos relacionamentos íntimos, em nada se refletindo no mundo do trabalho. Só que não é isso o que mostra a realidade dos fatos e do mundo do Direito. As questões envolvendo o sexismo no trabalho trazem à tona casos que revelam violação à liberdade de gênero e de orientação sexual dos trabalhadores, em especial os homossexuais, transexuais e travestis.


E é fato que estes se inspiraram muito na luta feminina para combater a discriminação de gênero. Independentemente da orientação sexual, esses profissionais abandonaram o desânimo, o conformismo e a sensação de fracasso e ingressaram no mercado de trabalho para demonstrar seus conhecimentos e habilidades, enfrentar a homofobia e exigir seus direitos. Sem dúvida, é uma grande evolução essa vontade de vencer preconceitos e de conquistar novos espaços profissionais, livres do sexismo.

Entretanto, ainda existem alguns vestígios de atitudes sexistas no ambiente de trabalho. É o que denunciam algumas ações julgadas na Justiça do Trabalho mineira. A seguir, veremos alguns casos, cujos números dos processos foram omitidos para preservar a privacidade das pessoas envolvidas.

Empregadas discriminadas por manterem relacionamento homossexual serão indenizadasA orientação sexual do trabalhador diz respeito à vida íntima de cada um, não devendo sofrer qualquer tipo de ingerência e nem mesmo indagação por parte do empregador, salvo necessidades específicas e excepcionais de um ou outro cargo. Assim se expressou a magistrada Aline Paula Bonna, em sua atuação na 30ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, ao apreciar um caso em que duas empregadas, em razão da orientação sexual, sem qualquer relevância para o desempenho das funções, foram expostas a situações constrangedoras e preconceituosas, incompatíveis com o ambiente de trabalho, que deve ser saudável e dignificante, como ressaltou a juíza.

A situação relatada pelas trabalhadoras foi comprovada pela prova testemunhal que revelou o caráter depreciativo dos vários comentários feitos pelos empregados da empresa. A esse respeito, o próprio gerente disse que teria que dispensar uma ou ambas as empregadas, por formarem um casal de lésbicas, já que a homossexualidade delas estava gerando muitos comentários no ambiente de trabalho. Inclusive, demonstrou que um dos motoristas da empresa teria dito a uma das empregadas que “alguns minutinhos com ele as faria deixar de gostar de mulher”. Contudo, conforme demonstrado pelos depoimentos colhidos, embora as empregadas tenham levado ao conhecimento da empresa as situações constrangedoras pelas quais vinham passando, a empregadora não tomou nenhuma atitude para protegê-las ou para cessar essa situação.

“Em consonância com os valores supremos da liberdade, do bem-estar e da igualdade, no âmbito de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social, consagrados no preâmbulo da Constituição da República, o inciso X de seu art. 5º consagrou a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”, destacou a juíza, frisando que, em casos como esse, o dano psicoemocional é presumido em relação ao homem médio que vivencia situação semelhante. Conforme explicou, o dano está implícito no caráter depreciativo dos comentários feitos pelos empregados da reclamada. E a empresa responde pelos atos dos seus empregados em serviço, independente de culpa (artigos 932, III e 933 do CC).

Assim, considerando as circunstâncias específicas do caso e atenta á função pedagógica da reparação civil, a juíza arbitrou a indenização em 7 mil reais para cada empregada. A empresa recorreu, mas a decisão, considerada irretocável pelo TRT de Minas, foi mantida.

Empresa é condenada por prática homofóbicaUm analista de Tecnologia da Informação procurou a Justiça do Trabalho pedindo o pagamento de indenização por dano moral. Tudo porque, segundo contou, sofria preconceito, constrangimento e chacotas na empresa de locação de frotas, onde trabalhava, por conta da sua opção sexual. De acordo com o trabalhador, o próprio chefe fazia críticas e o diminuía perante os colegas. O caso foi submetido à apreciação do juiz Eduardo Aurélio Pereira Ferri, titular da 8ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, que, após analisar as provas, concluiu que a versão apresentada pelo trabalhador é verdadeira. Considerando a conduta da empresa arbitrária, abusiva e inaceitável, o magistrado decidiu reconhecer o direito à reparação por dano moral.

A ré negou que desrespeitasse o reclamante. Na defesa, fez questão de registrar que ele tinha o pior desempenho na sua área de atuação. No entanto, ao analisar o processo, o juiz sentenciante teve certeza de que o trabalhador foi vítima de constrangimentos ao longo do contrato de trabalho. Uma testemunha confirmou que os colegas se referiam ao analista com expressões grosseiras e abusivas, como “bicha”, “veado”, “incompetente” e “burro”. Para o julgador, o fato de não serem ditas na presença do empregado não retira a gravidade da conduta. “No mundo contemporâneo, em nosso país, não há espaço para sequer comentar sobre a opção sexual de quem quer que seja”, enfatizou na sentença.

O julgador constatou que o próprio superior hierárquico do analista de TI o constrangia publicamente. Também encontrou expressões desrespeitosas relacionadas ao reclamante em documentos anexados aos autos. Conforme apurou o magistrado, em uma oportunidade, o representante do réu na audiência fez questão de enviar cópias dos escritos aos demais empregados. Além disso, ele divulgou a história de um homossexual na empresa. Para o magistrado, uma forma de provocação e humilhação ao reclamante, já que a história nada tinha a ver com o objeto social da empresa. O real objetivo ficou claro: atingir o reclamante.


“Constatou-se, portanto, que a dignidade e a honra do reclamante foram violadas por conduta abusiva desenvolvida em seu ambiente profissional, razão pela qual o mesmo faz jus ao recebimento de uma indenização pelos danos morais sofridos”, foi como decidiu o juiz. O entendimento foi mantido pelo TRT de Minas, que apenas reduziu o valor da indenização para 5 mil reais.

Notícias jurídicas anteriores relacionadas à matéria: 

Para se aprofundar sobre o tema: 
– Leia aqui o artigo “Proteção ou discriminação? Passando a limpo algumas normas de tutela do trabalho da mulher”, da autoria de Flávio da Costa Higa e Regina Stela Corrêa Vieira, disponível na JusLaboris.

Clique aqui para ler a jurisprudência do TRT-MG sobre sexismo no trabalho

Clique aqui para ler a jurisprudência do TST sobre sexismo no trabalho


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