domingo, 10 de junho de 2018

Mais uma vez: A classe média na visão de Jessé de Sousa

Hahahahaha são tanto lalau assim?
A obra de Jesse Souza é simplesmente sensacional. Chama-se “A Elite do Atraso”, Editora Casa da Palavra, Rio de Janeiro, RJ. Leiam esta obra do começo ao fim que vocês adquirirão conhecimentos sobre o Brasil, especialmente de 2016 para cá, que não encontramos pela ai. 

Vou reproduzir trecho da pg. 181 até pg. 186 onde o autor dá pinceladas sobre a Classe Média no capítulo intitulado “A corrupção real e a corrupção dos tolos”: 

Vamos lá: 

A corrupção real e a corrupção dos tolos uma reflexão sobre o patrimonialismo 

A classe média, malgrado sua heterogeneidade é dominada por ideias semelhantes. o que dificulta enormemente a construção de uma concepção alternativa e crítica de nossa sociedade. Foi isso que fez com que, quando a Rede Globo e a grande mídia conservadora chamaram seu público cativo – a fração protofacista da classe média – às ruas em 2013 e 2016, frações significativas das outras frações também reagissem ao apelo. Toda a manipulação política desses setores é marcado pelo prestígio da noção de patrimonialismo e por consequência da corrupção apenas da política e nunca do mercado (grifo meu). A não ser que o empresário tenha cometido o crime capital de ter se associado ao governo do PT. Para estes não há perdão. Devem ficar, inclusive, como exemplos para o futuro. Mas todos os outros não apenas estão soltos, como também, como Joesley Batista, culpam a política como se tivessem sido forçados por estes e não o contrário. Como é possível tamanha desfaçatez na inversão da captura da política pelo mercado? 

Isso se deve, a meu ver, à carga de prestígio associada à noção de patrimonialismo como a pseudoexplicação mais importante para tudo o que acontece na sociedade brasileira. A noção de populismo, também muito importante para legitimar o ódio e o desprezo aos pobres, é uma noção auxiliar. A ideia do patrimonialismo é ainda mais fundamental, já que eivada de prestígio acadêmico e repetida por todos os intelectuais orgânicos dessas frações. A grande imprensa depois, envenena seus leitores distribuindo a distorção sistemática da realidade que essa leitura implica, por assim dizer, em pílulas todos os dias. Por conta disso, iremos neste capítulo examinar mais de perto essa noção sob o ponto de vista de sua (in) capacidade explicativa. Como esse capítulo é inevitavelmente um debate mais teórico, o leitor menos interessado nessas questões pode pulá-lo e passar diretamente ao capítulo mais político da conclusão. No capítulo da conclusão, iremos ver mais de perto como o conluio entre a grande mídia e a Lava Jato, legitimando sua ação com a noção de patrimonialismo, preparou o terreno para nossa elite do atraso, mais uma vez, praticar seu saque e sua rapina às custas de toda a população. 

Como pesquisador acho importante se comprovar empiricamente o que se diz. Por conta disso vou realizar um experimento empírico que possa comprovar, para qualquer um, a influência avassaladora dessa ideia-força, falsa e superficial como ela é, na nossa sociedade. Reunirei aqui as ideias de figuras públicas de destaque na vida brasileira que expressam o quadro heterogêneo que montamos da classe média, ou seja, a classe que é responsável pela reprodução da sociedade, assumindo tanto as funções de controle e supervisão material quanto as funções de justificação e legitimação da ordem social. E isso tanto no mercado quanto no Estado. Veremos como a ideia-força do patrimonialismo efetivamente conseguiu dominar todas as frações da classe média e se tornar o principal obstáculo para qualquer percepção efetivamente nova e crítica da sociedade brasileira. 

Assim tomei como exemplos recentes intervenções públicas de três figuras que são referência para todas as rações de classe média que analisamos até agora: o procurador Deltan Dallagnol, o intelectual da Lava Jato, como expoente da fração protofascista da classe média; o ministro Luis Roberto Barroso, do STF, como representante das frações de centro, a liberal e a classe média de Oslo e, finalmente, o ex-prefeito Fernando Haddad, como representante da fração crítica, mais a esquerda. O que existe de comum em todos eles é o fato de pensarem a sociedade brasileira sob a égide da noção de patrimonialismo. 

Esse fato mostra a força espantosa dessa ideia que se naturalizou entre nós de tal forma que pessoas tão diferentes, com interesses até opostos, expressam sua visão de mundo com uma mesma ideia. Como vimos, a elite econômica que logrou consolidar uma visão de mundo hegemônica em seu benefício fez com que mesmo a crítica social seja feita segundo seus próprios termo, enfraquecendo, obviamente, o alcance e a radicalidade de qualquer crítica. A ausência de perspectivas efetivamente críticas que vivemos advém desse fato mais que de qualquer outro. 

Entre os três exemplos quem está mais em casa no tema do patrimonialismo é o intelectual da Lava Jato, o procurador Deltan Dallagnol. A fração que ele expressa, a fração profofascista da classe média, que logrou nos últimos anos sair do armário e se assumir enquanto tal, gritando alto e bom som seus preconceitos e seus ódios antes escondidos, tem na corrupção seletiva do suposto Estado patrimonial sua legitimação mais importante. Retirei o texto que exponho a seguir de Dallagnol de sua página do Facebook. Um texto entre literalmente centenas com exatamente o mesmo conteúdo. Percebemos, facilmente, por que não a reflexão, mas sim a repetição de uma suposta certeza faz parte do núcleo de justificação dessa fração de classe. 

Post de 8 de janeiro de 2016, um entre tantos com mesmo conteúdo. 

No post de 25 de dezembro ... vimos que a ausência de organização da sociedade e da formação de uma identidade nacional permitiu um Estado controlado por elites corrupts, os “donos do poder”, num ambiente favorável a práticas com clientelismo, coronelismo, nepotismo. 

Além disso, o estamento aristocrático, na clássica avaliação de Raymundo Faoro, desenvolveu-se em um “estamento burocrático”, formado por autoridades públicas que são espécies de “seres superiores” que não se subordinam à lei: fazem o que quereme não são punidos. A autoridade é transferida dos cargos aos seus ocupantes, como se o poder irradiasse da pessoa e sem limites de seu exercício – o que explicaria a comum, mas infeliz, pergunta: “você sabe com quem você está falando?”. Some-se, dentro desse contexto, que, analisando as características do brasileiro, o célebre Sérgio Buarque de Holanda, em seu consagrado Raízes do Brasil, definiu-o o “homem cordial”. O tecido social teria por base relações de afetividade, paixão ou sentimento, criando o “jeitinho brasileiro”. 

A concepção vira-lata do brasileiro que estamos criticando mstra-se aqui à luz do Sol. Sérgio Buarque e Raymundo Faoro como legitimação perfeita do protofascismo brasileiro. O brasileiro é malformado de nascença por uma herança cultural pensada como estoque do mesmo modo e com os mesmos objetivos que o racismo da cor da pele antes cumpria. A manipulação midiática da conjuntura política concreta faz com que essa fração seja a tropa de choque perfeita da elite econômica, a qual se pode dar ao luxo de se manter à sombra sem precisar se envolver nas disputas políticas de rua. 

Os “camisas amarelas”, tão explorados como todas as outras classes e setores sociais por essa mesma elite, dispõem-se a defender seus interesses econômicos devidamente travestidos em princípios morais precisamente para dirigir o ódio dessa classe a qualquer liderança popular. A operação Lava Jato foi desde seu começo uma caça aos petistas e a seu líder maior, como forma de garantir e assegurar a mesma distância social em relação aos pobres que não os torne tão ameaçadores como eles haviam se tornado com Lula. O maior perigo representado pelos pobres foi quando eles começaram a poder entrar para a universidade pública, reduto dos privilégios da classe média, pois durante a administração do PT aumentou de 3 para 8 milhões o número de matriculados (grifo meu). 

Se não fosse essa a razão, o que faria os “camisas amarelas” – versão nacional dos “camisa negra” de Mussolini – ficarem em casa quietinhos, agora, em meados de 2017, quando a corrupção real mostra sua pior face? Se fosse a corrupção o que indignasse esse povo, o panelaço deveria ser ensurdecedor agora, não concorda leitor? Onde estão os “camisas amarelas”? É a seletividade da corrupção não só apenas no Estado, mas apenas dos partidos de esquerda, que querem diminuir a distância entre as classes sociais, o que verdadeiramente move e comove nossos “camisas amarelas”. Deltan Dallagnol é sua mais perfeita expressão: líder tosco, primitivo, cheio de certezas e verdades seletivas. 

Mas o patrimonialismo, como leitura social dominante dos brasileiros acerca de si mesmo, não comove apenas os protofascistas. Os liberais e os “classe média de Oslo” também são dominados por esssa leitura. O ministro Luis Roberto Barroso é um perfeito exemplo dessa fração. Para uma comunicação no dia 8 de abril de 2017, em uma universidade americana, o ministro do STF prepara uma fala que condensa sua imagem do Brasil moderno, O título da fala é sugestivo: “Ética e jeitinho brasileiro: por que a gente é assim?”.

O que Jesse nos mostra é que, as teses predominantes sobre a sociedde brasileira, inclusive aquelas adotadas por intelectuais como Faoro e Fernando Haddad, se baseiam num conhecimento calcado no patromonialismo escravista que os leva e a nos todos a erros colossais que possibilitam a subida ao poder de um governo do tipo que está aí. O fim da picada...
José Augusto Azeredo




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