sábado, 3 de agosto de 2019

Brasil é modelo a ser seguido quando se trata de alimentação escolar



São 43 milhões de refeições distribuídas diariamente aos estudantes da rede pública, muitos dos quais contam apenas com essa refeição diária


A agência de notícias RT, cuja leitura constante recomendo vivamente, noticiou, no dia 20 de julho, que a escola “Wyoming Valley West“, no Distrito de Pensilvânia, EUA, advertira os pais de alunos que não haviam pagado a alimentação escolar dos filhos – por longo tempo – de que, caso não saldassem as respectivas dívidas, poderiam até mesmo perder a guarda das crianças.

A notícia, obviamente, aterroriza. Em primeiro lugar, porque desde o golpe de estado de 2016 somos, de fato, um País sob ocupação daquela potência estrangeira, cujo papel na “mudança de regime” fica mais evidente a cada dia, graças às revelações do The Intercept Brasil.

Vale recordar que, após a aprovação das Diretrizes Voluntárias para o Direito à Alimentação, em 2004, pelo conjunto dos países integrantes da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) – criminosamente extinto pelo atual governo de fato – conseguiu aprovar, em 2006, a Proposta de Emenda Constitucional que inseriu no artigo 6 da Constituição Federal o direito à alimentação como um direito humano.

Como à época das negociações daquelas diretrizes éramos um País independente, a delegação brasileira foi extremamente ativa e em muito contribuiu para a conclusão exitosa daquele documento internacional, que em muito contribuiria, posteriormente, para que mais de 14 países latino-americanos viessem a contar com legislações extremamente avançadas, no campo da segurança alimentar e nutricional.

Ao observarmos aquele período, com a distância que o tempo permite, fica evidente o processo paulofreiriano: aportamos às negociações o nosso conhecimento, fruto da experiência bem sucedida da estratégia Fome Zero; colhemos um documento de grande qualidade e com ele construímos o caminho que nos levou ao reconhecimento constitucional do direito humano à alimentação.

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Graças a esse processo dialógico avançamos muito, juntamente com o conjunto da comunidade internacional. A tal ponto evoluímos que a região latino-americana e caribenha tornou-se aquela com as mais avançadas legislações em tema de segurança alimentar e nutricional. De fato, muitos dos países passaram a reconhecer o direito à alimentação como direito humano, protegido, promovido e provido nas respectivas legislações nacionais.

Com efeito, os países do Sul ultrapassaram até mesmo muitos países do Norte nessas garantias, inclusive a própria atual potência ocupante, que não reconhece ao direito à alimentação o status de direito humano, embora o faça com o direito à propriedade que, na verdade, é apenas direito civil, não universalmente cogente – ao contrário dos direitos humanos, pois diz respeito apenas às partes contratantes.

Com base nessa experiência, passamos a cooperar internacionalmente.

Um primeiro obstáculo foi a compreensão do Banco Mundial de que se deveria focar apenas nos estudantes pobres, ao que contra-argumentamos que a alimentação não se resumia à ingesta de alimentos, indo além, sendo comunhão, como o cristianismo e os rituais de matriz africana bem simbolizam.

Ao lado disso, notamos que, em sociedades capitalistas, declarar-se pobre é vergonha que recai sobre os pais, que – pelo errôneo critério da meritocracia rasa – não seriam capazes.

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O modelo brasileiro foi vencedor e cooperamos com inúmeros países do Sul, para a implementação da alimentação escolar nas respectivas nações. Estabelecemos parcerias com a FAO e o Programa Mundial de Alimentos (PMA), o qual, no âmbito das Nações Unidas, tem o mandato para a implementação de programas nacionais de alimentação escolar.

Vale observar que, no Brasil, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) distribui diariamente 43 milhões de refeições para os estudantes da rede pública, muitos dos quais contam apenas com essa refeição diária.

Passamos à implementação de programas de aquisição de alimentos da agricultura familiar, nos moldes do PAA brasileiro, de molde a abrir os mercados institucionais para a agricultura familiar, inclusive porque três quartos dos pobres do mundo encontram-se no meio rural.

Por meio da FAO, financiamos assistência técnica para a melhora da produção e, através do PMA, cooperamos para a estruturação dos programas nacionais de alimentação escolar.

Trabalhamos no Haiti; na maioria dos países da América Central; na Colômbia; Bolívia; com toda a União Africana (com projetos específicos em Moçambique, Malawi, Etiópia, Níger e Senegal, sendo, portanto, um país por cada março-região africana); Palestina; Paquistão e Filipinas, entre outros.

Fomos o modelo internacional de políticas públicas virtuosas, capazes de gerar ganhos múltiplos: no caso da alimentação escolar adquirida da agricultura familiar, por exemplo, ganha-se com a melhora nutricional dos alunos; com a consequente maior capacidade cognitiva; e com a inserção socioeconômica das famílias produtoras.

O êxito dessa cooperação leva muito dos países parceiros a se perguntarem como foi possível um País que tanto avançara na garantia de direito humano tão básico quanto o direito à alimentação, deixar-se dominar por potência que não apenas não protege, promove ou provê aquele direito, mas também sobrepõe ao direito humano um direito inferior, o direito civil de compra e venda. Destarte, comercializa um direito, aliena o futuro, e demonstra aos jovens – na cruel imposição da fome – a selvageria de um modelo de sociedade brutal, domínio da ignorância, da concupiscência, do mau em última instância.

Este texto não reflete necessariamente a opinião de CartaCapital.

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