A defesa, respeito e ampliação dos direitos humanos de todos os seres em nosso planeta têm cada vez mais ocupados as mentes, consciências e corações de todos aqueles que entendem que é possível construir um mundo melhor e que todos merecem uma vida mais digna.
Edwaldo Alves da Silva
22/05/2020
Esta aspiração esbarra na sociedade de classes,
capitalista, cuja ideologia prega e difunde valores incompatíveis com a
justiça, fraternidade, igualdade e oportunidades para todos. A
dominação/exploração de uma classe sobre a outra é a forma de existência da
busca desenfreada pelo lucro, pela apropriação das riquezas criadas pelo
trabalho humano e a sua reprodução que garante a manutenção desse tipo de
sociedade. Dessa relação de produção, de classes, se erige todo o arcabouço
jurídico, de poder, de dominação, moral, de cultura e costumes que não questionam
a natureza da sociedade que acumulam tanta riqueza em um extremo e tanta
miséria em outro.
O resumo acima apresentado, nos instiga a
aventurar-se na análise das principais mutações ocorridas no desenvolvimento
das forças produtivas que podem influir no comportamento do principais atores
que atuam no cenário social. Tal estudo deve ter o objetivo básico de organizar
os trabalhadores, as classes subalternas, os segmentos e agrupamentos sociais
que têm a sua vida e desejos reprimidos pelo atual regime político e social,
agrupando-os pela consciência necessidade e vontade, para lutar por uma
sociedade diferente da atual.
Desde a segunda metade da década de sessenta do
século passado, o mundo passou a viver com uma intensa e complexa revolução
técnico-cientifica. Como é próprio desses fenômenos ocorre inicialmente nos
países mais avançados economicamente e vai se estendendo aos países
periféricos, sendo que esses precisam enfrentar a forte resistência daqueles
que possuem a ciência e a tecnologia, uma vez que as transformam em arma de
mando e poder, sem jamais admitir tratar-se de bens de toda a humanidade.
A revolução tecno-científica é fruto dos avanços
acumulados do conhecimento humano universal, mas foi impulsionada pela enorme
influência da competição na conquista espacial e pela infame corrida
armamentista nos marcos da guerra fria.
O salto qualitativo desses novos tempos aconteceu
quando a ciência foi largamente associada e utilizada no processo produtivo.
Novas descobertas influenciaram o papel da força de trabalho humano, o mesmo
observou-se na divisão social do trabalho provocando diferentes formas de
exploração das classes. As alterações ocorridas nas forças produtivas a partir
de novos parâmetros de produtividade mexeram extraordinariamente com o mundo
social, político e de classes. Guardando-se as devidas proporções no espaço e tempo,
pode-se afirmar que a atual revolução técnica-cientifico deve provocar grandes
modificações na vida social como aconteceu com a revolução industrial na
segunda metade do sec. XVIII.
No campo internacional assistimos ao fim da chamada
guerra fria. O tipo de socialismo então existente, com todas as suas
deformações ainda era um contraponto ao predomínio absoluto do capitalismo
imperialista, principalmente nos conflitos internacionais. Trinta anos após
esses acontecimentos ainda se estuda o seu desmanche, que além de resultado de
suas próprias contradições internas, deveu-se também à vitória do capitalismo
na emulação entre os EUA e a URSS no campo do aproveitamento e da inclusão da
ciência e da tecnologia na produção. Enfim, a liquidação do então chamado
sistema socialista mundial, nos recorda a frase do célebre filósofo alemão:
tudo que é sólido desmancha no ar ! Hoje, os EUA reinam absolutos na arena
internacional. Os países que afirmavam perseguir um caminho não capitalista
sucumbiram à nova lógica produtiva e à arcaica estratificação política que
teimavam em preservar. A evolução política e econômica da China, do Vietnã e de
maneira particular Cuba, merece um estudo específico em outro momento.
Os impactos da ciência e da tecnologia provocaram enormes
mudanças no processo produtivo, cujo desenvolvimento e influência nas relações
sociais ainda é difícil prever até aonde podem chegar. Para os trabalhadores,
como classe, pode-se afirmar que piorou drasticamente as condições de trabalho
e vida.
O capital financeiro, expressão máxima do
capitalismo nos tempos atuais, pouco mudou exceto na aplicação de meios
eletrônicos que permitem a sua operação em temos globais instantaneamente. De
resto, pouco se importa com o processo ou relação de produção, uma vez que
opera diretamente com os lucros que as atividades econômicas podem gerar.
No mundo do trabalho as consequências foram cruéis.
As taxas de mais-valia assumiram proporções estratosféricas. A relação trabalho
humano social e quantidade de riqueza criada diminuiu aparentemente o papel da
força de trabalho na produção de bens e serviços permitindo a diminuição da
contratação de trabalhadores, ocasionando desemprego e gerando um mercado de
reserva nunca visto na história da humanidade. Essas tendências próprias do
capitalismo estão se estendendo rapidamente às atividades agrícolas.
A robotização e a simplificacão de trabalhos
complexos têm sido elementos importantes da precarização dos trabalhadores.
Atualmente, é possível prever que o chamado “estado do bem estar social”, a
garantia de trabalho, de direito social e previdenciário, de reconhecimento da
especialização de trabalhadores, o conceito de garantir o sustento do
trabalhador e sua família para garantir a reprodução do capital para a burguesia
não cabem mais nas condições atuais. A própria manutenção do mercado industrial
de reserva não tem mais sentido para o empresário, que sabe que a tendência
atual é o aumento de desempregados e a diminuição constante da quantidade de
força de trabalho necessária para a manutenção e desenvolvimento da produção,
garantindo e aumentando sempre a taxa de lucros. A rotatividade da mão de obra
e o imenso mercado de reserva garantem a reposição. Tal é a base para a
precarização do trabalho, da atividade intermitente, contratos provisórios e
tantas outras medidas que esmagam os trabalhadores cuja maior parte ainda não
percebeu que se trata de um novo nível da luta de classes. Os sindicatos e
organizações populares foram enfraquecidas por medidas judiciais e econômicas.
O número de trabalhadores seja na indústria, nos
serviços e no campo diminuiu drasticamente. A renda do trabalhador no PIB tem
caído constantemente. O desenvolvimento do capitalismo, nos tempos atuais,
jogou milhões nas ruas e campos lutando pela sobrevivência. Os ideólogos
burgueses não têm vergonha de denomina-los de “empreendedores”. O Congresso
Nacional em uma medida compensatória aprovou o pagamento de um “auxilio
emergencial” no ínfimo valor de R$ 600,00, e esperava-se o surgimento em torno
de uns vinte milhões de necessitados e surgiram mais de cinquenta milhões,
criando imensas e perigosas filas na porta da Caixa Econômica em plena
pandemia. Soma-se a tal massa os milhões que não conseguiram dispor de todos os
documentos e requisitos exigidos, e, ainda a enorme massa daqueles que vivem na
roça. Este é o tamanho mínimo da miséria em que o capitalismo jogou o povo
brasileiro.
Acredito que as mudanças ocorridas aprofundaram uma
nova realidade social. Hoje, o capital além de explorar os trabalhadores também
explora toda a sociedade e todo o povo. Pode-se afirmar que a contradição
principal entre os trabalhadores e os patrões extrapolou as paredes da empresa
e expandiu-se para toda a sociedade.
Radicalizou suas piores tendências: violência, marginalidade,
preconceitos, racismo, xenofobia, busca incessante pelo lucro e o poder,
misoginia, discriminação social e as diversas formas de degradação moral e
ética. Esse universo deve ser o nosso campo de luta. Não se trata de desprezar
e abandonar as lutas, a ideologia e a politica dos trabalhadores, mas, entender
que as consequências do desenvolvimento do capitalismo fez emergir atores que
devem ter um papel destacado na luta política e social. Neste sentido, não
acredito ser a melhor política compartimentar e separar esses diversos
segmentos. Não é fundamental, na minha opinião, que tenham organizações
especificas de diferentes níveis na estrutura de estado, o que importa é uma
política unitária e consciente do papel do capitalismo e das classes na situação
em que vivem. A diversidade e complexidade dessas lutas no campo das
contradições do capitalismo não devem estreitar-se nos limites burocráticos de
especificidades de cada uma delas. Acredito que o fundamental é o entendimento
teórico dessas questões e a nossa capacidade de criar políticas unitárias e dar
importância a cada uma delas em cada momento e situação objetiva que estiver
enfrentando. Não há contradição entre o que podemos conceituar como particular
e o geral. As manifestações se aglutinam, se desdobram e se unem
dialeticamente, de certa forma, assemelhando-se a células no campo biológico.
Podemos exemplificar, com a luta geral contra o racismo e a igualdade racial
que assumem especificidades relacionadas à mulher negra que integram o combate
contra o racismo e também pelos direitos de gênero. O mesmo se pode dizer sobre
a juventude negra que é a primeira vítima a sofrer diariamente a violência e
arbítrio policial. Da mesma forma, as diferentes ações de combate aos
preconceitos e injustiças devem integrar-se e assumir política unitária e
combativa.
As raízes históricas e sociais desses segmentos são
bastantes diversas na questão geográfica e no tempo. A luta das mulheres no
Brasil, por exemplo, é muito diferente daquelas que vivem em alguns países
árabes, asiáticos e africanos. O mesmo ocorre com o racismo, no Brasil com a
vida, costumes, cultura, religiões e outras manifestações da raça negra
perseguidas e violentadas desde o infame sistema escravagista, diferentemente
do que acontece em grande parte dos países latino-americanos nos quais o
racismo é mais forte com os indígenas, e também em muitos países onde a aversão
aos imigrantes assume formas racistas. Portanto, admito que manifestações
homofóbicas, machistas, preconceituosas, enfim, diversas atitudes que
contrariam direitos fundamentais da pessoa humana que não são diretamente
ligadas a relação trabalhoXcapital podem ser abrigadas no conceito geral de
Defesa dos Direitos Humanos e de defesa da natureza e do meio ambiente. Sejam
contra o racismo, contra a violência às mulheres e a misoginia, à luta LGBT, a
defesa dos direitos da pessoa deficiente ou diferente, contra a violência
policial e tantas outras forma de exploração e abusos que contrariam os
direitos fundamentais do ser humano. Acredito que as profundas mudanças
ocorridas no capital estenderam suas mazelas para praticamente toda a sociedade
confirmando as previsões do filósofo alemão anteriormente citado. Neste
sentido, julgo interessante estudar a ampliação do nosso universo de luta,
equacionando teoricamente esses conceitos para compreender as diferentes formas
que estão assumindo as lutas populares nos tempos atuais. Mais do que em
qualquer outro período histórico a defesa, garantia e ampliação dos direitos
inalienáveis da pessoa humana e da preservação do meio ambiente e da natureza
somam-se às bandeiras históricas das lutas libertárias dos trabalhadores e do
povo por um mundo melhor, contra o capitalismo, pela democracia e o socialismo.
Edwaldo
Alves da Silva
PT de
Vitória da Conquista
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