Morreu na noite desta sexta-feira de complicações cardíacas padre Ticão, uma das maiores referências da Igreja Católica progressista no Brasil. Ele era líder da luta pela moradia e educação popular, pela legalização da maconha medicinal, da saúde popular e alternativa e defensor do aborto legal
2 de janeiro de 2021, 08:38 h Atualizado em 2 de janeiro de 2021, 09:35
247 - Morreu na primeira noite de 2021 padre Ticão, pároco da Paróquia de São Francisco de Assis, do setor Ermelino Matarazzo, na zona leste de São Paulo, onde liderou as lutas populares por décadas. Ticão morreu aos 68 anos, devido a seus problemas cardíacos -durante 42, foi sacerdote. Era líder da luta pela moradia e educação popular, pela legalização da maconha medicinal, da saúde popular e alternativa e defensor do aborto legal.
Padre Ticão dedicou-se, nos últimos três anos, aos temas vinculados à saúde popular e à construção de alternativas à medicina tradicional -ele era um crítico impiedoso da indústria farmacêutica. Assista, ao final desta reportagem, entrevista que ele concedeu, em agosto de 2019, ao canal Paz e Bem, associado ao 247. Na entrevista, ele afirmou, entre outras coisas, a necessidade do cuidado pessoal com a saúde: “seja médico de você mesmo". Defendeu “uma medicina preventiva, educativa, holística e integrativa”. A morte do sacerdote recoloca um tema de grande relevância: quem cuida dos cuidadores e cuidadoras?
O Hospital Santa Marcelina (HSM) Itaquera, onde ele estava internado, informou em nota oficial que “o paciente deu entrada na unidade, nesta quinta-feira (31), em decorrência de uma arritmia cardíaca e o diagnóstico de edema pulmonar, permanecendo internado sob cuidado intensivo e cardiológico. E na noite dessa sexta-feira (1), faleceu, após nova descompensação da arritmia cardíaca, seguida de parada cardiorrespiratória."
Mauro Lopes, editor do 247 e âncora do Giro das 11 na TV 247, e um estudioso da Igreja católica, afirmou: “Padre Ticão era um líder revolucionário na Igreja e na esquerda - entendeu como poucos que não há "pauta identitária" (como querem alguns na esquerda, pra criticar) nem temas vetados (como querem muitos na Igreja). Para ele, importava a vida concreta, o sofrimento e as alegrias das pessoas. Um grande homem. Um homem da história e do planeta, muito além da Igreja institucional e da esquerda tradicional”.
Antonio Luiz Marchioni era seu nome civil, mas só era conhecido por padre Ticão. Começou a lutar ao lado do povo brasileiro ainda na década de 1970, em plena ditadura, apoiando greves de bóias-frias e de professores na região de Araraquara (SP). "No interior, me chamavam de comunista", disse ele certa vez em entrevista à Folha de S. Paulo.
Na década seguinte, liderou a invasão, ao lado de membros das Comunidades Eclesiais de Base e pessoas da Zona Leste, do prédio da Secretaria de Estado da Habitação, para pressionar o então governador Franco Montoro (1983-87) a construir conjuntos habitacionais. Foi um grande apoiador das ocupações na região, muito antes da fundação do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST).
"Ele teve um papel decisivo para a construção do campus da UNIFESP na Zona Leste", observou o ex-ministro Aloizio Mercadante (veja na repercussão a seguir).
Repercussão
Padre Júlio Lancellotti, pároco da Pastoral do Povo da Rua de São Paulo, ao 247: “A morte de padre Ticão é a perda de um modelo de Igreja, comprometida com o povo, a mudança, a transformação, com o Evangelho”.
Aloizio Mercandante, ex-ministro e ex-senador, ao 247: "Padre Ticão, exerceu o sacerdócio como um verdadeiro Franciscano, toda uma vida dedicada ao povo sofrido da Zona Leste de SP. Estivemos juntos em muitas lutas, campanhas e em belos momentos. Ele teve um papel decisivo para a construção do campus da UNIFESP na Zona Leste, iniciativa da gestão do Ministro Fernando Haddad, que como sucessor no MEC, tive a honra de consolidar. Fará muita falta. Um amigo, mais uma perda muito difícil, nestes tempos sombrios de tantas despedidas. Continuará sempre presente no coração do povo da sua querida Zona Leste".
Bruno Covas, prefeito de São Paulo: “2021 começa com a triste notícia do falecimento do Padre Ticão. Grande defensor da população mais carente da Zona Leste de São Paulo. Um guerreiro na luta pela diminuição das desigualdades sociais. Descanse em paz".
Paulo Teixeira, deputado federal (PT): “Adeus Padre Ticão. Padre Ticão era chamado o ‘Trator de Deus’ por Dom Angélico Sandalo Bernardino, antigo Bispo da Zona Leste.A região conquistou através das lutas lideradas por ele, um campus da USP e um campus da Unifesp, além da Faculdade de Medicina Santa Marcelina. Conquistou também uma unidade do Instituto Técnico Federal. Dois Hospitais, um em Itaim Paulista e outro em Ermelino Matarazzo. Padre Ticão impulsionou os movimentos de moradia na década de 80, que resultaram nos mutirões de construção de casas pelo sistema de autogestão. Mais recentemente ele estava voltado para difundir os saberes da medicina tradicional e da fitoterapia. Entre tantos cursos que promoveu, ele difundiu para todo Brasil o uso terapêutico da cannabis medicinal. Era uma pessoa à frente do seu tempo, um visionário, além de um religioso acolhedor e realizador. Desde o firmamento ele continuará a nos convocar para as lutas por um país mais justo”.
Sâmia Bonfim, deputada federal (PSOL): "Sempre em defesa dos direitos humanos, dos oprimidos e das liberdades democráticas, deixará saudades e um legado de generosidade e luta por justiça social".
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