As páginas da nova edição de CartaCapital mostram uma figura atual do governo Bolsonaro. Caso comparada ao boi da cara preta, este parecerá um jovem garboso, quem sabe disposto a versejar em tardes ensolaradas.
Em sua função de ministro da Defesa do Brasil de Bolsonaro, apresentamos o general Paulo Sérgio Nogueira, este sim habilitado a assustar o país que haveria de defender. Na proximidade das eleições de outubro, ele avisa que as Forças Armadas brasileiras estão sempre alerta para cumprir sua tarefa constitucional. A ameaça golpista está feita.
A tal garantia do papel dos militares consta do artigo 142, cujo teor, quero crer, escapou ao presidente da Constituinte de meio período destinada a preparar o futuro, o doutor Ulysses Guimarães. Esta referência não consta de nenhum texto constitucional de países democráticos e civilizados. É coisa nossa, tipicamente nossa, atribuir às Forças Armadas o chamado papel moderador, com o peso que pode ter qualquer passagem da nossa Carta. É nela, evidentemente, que se baseiam os militares que, desde a derrubada da monarquia, infestam o País com seu golpismo inelutável apoiado pelas armas.
O golpe de 1964 é uma das grandes desgraças brasileiras, juntamente com a colonização predadora e a escravidão. A fala do ministro da Defesa foi enriquecida por um encontro anterior com o presidente do STF, Luiz Fux, aquele que faria a alegria de um sioux, caso o encontrasse, e, além do mais, pronto a aplaudir, até esfolar a palma das mãos, o discurso do general pronunciado em um tom imaginável, embora fosse evidente a ameaça golpista. Faz tempo verificam-se manifestações de contrariedade fardada e, sobretudo, de pijama à vista da eleição.
A ameaça está clara, mas quem se incomoda com ela? Desde o povo até os empresários da Fiesp, não reagem, inseridos em uma normalidade à brasileira, a mostrar algo assim como um misto de abulia e ignorância. Um dado positivo é representado pelo discurso pronunciado no lançamento da candidatura Lula, no início da campanha, pelo vice-presidente da chapa, Geraldo Alckmin. Um discurso substancioso, temperado com sutileza por passagens carregadas de senso de humor, a esclarecer a escolha do ex-governador de São Paulo como companheiro de chapa de Lula. Está no ar, contudo, a ameaça golpista do general Nogueira, favorecida pela tibieza tanto do Supremo quanto do Congresso e amparada pelo famigerado artigo 142.
Vale neste instante celebrar a ausência do embaixador dos EUA, Lincoln Gordon, que não hesitou em conspirar com os golpistas de 1964, ao ventilar a chegada às costas brasileiras da frota atlântica norte-americana. Convém louvar hoje a presença na Casa Branca de Joe Biden, disposto a determinar mudanças cruciais na política exterior de Washington. De fato, é do Departamento de Estado que emergem esclarecimentos muito significativos deste ponto de vista. Tio Sam agora nos sorri e manifesta contrariedade diante das posturas do general Nogueira.
Tentativas de golpe na América Latina serão condenadas, conforme os porta-vozes do Departamento. Não é trabalhoso demais estabelecer uma ligação de causa e efeito entre as posições de Washington e a ameaça golpista do bolsonarismo previamente amedrontado pela proximidade das eleições.
Mino Carta
Diretor da Redação
Carta Capital
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