12 de outubro de 2016 às 00h57
Sobre canalhas e greve geral
“Canalha, canalha, canalha!”
Tancredo Neves no momento em que Auro de Moura Andrade, presidente do Senado, declarou vaga a presidência da República quando João Goulart estava em território nacional; apud Roberto Requião na sessão do Senado que votou o impeachment da presidente constitucional.
Sete pontos e quatro conclusões
Ponto 1. Michel Temer pretende enviar ainda este mês ao Congresso a proposta de reforma da Previdência. Prevê-se idade mínima para aposentadoria de 65 anos. Em várias regiões do Brasil vive-se em média 65 anos. O que significa que milhões de brasileiros morrerão trabalhando.
Também se cogita a elevação da alíquota da contribuição previdenciária dos servidores para 20%. Com isso, um servidor que ganha 4.000 mil reais (4,5 salários-mínimos) será sangrado em 27,5% para o Imposto de Renda e 20% para a previdência.
Ponto 2. A PEC 241, em tramitação, estabelece teto para despesas com saúde e educação. Nos próximos 20 anos não poderão ser maiores do que a inflação do ano anterior, ou seja, congeladas em termos reais. Uma noção do que representa isso. Se implantada no período 2006 – 2015, significaria uma diferença de 290 bilhões na saúde e 384 bilhões na educação.
Na área da saúde é um genocídio anunciado. Dor, sofrimento e morte para milhões de brasileiros que dependem dos serviços públicos de saúde. E haverá mais 20 milhões de brasileiros ao longo dos próximos 20 anos.
Ponto 3. Comissão da Câmara acaba de aprovar a projeto do senador Serra que altera as regras do pré-sal. Retira a obrigatoriedade de participação da Petrobrás, o que ao fim e ao cabo entregará fabulosa riqueza às companhias petrolíferas internacionais.
Não há uma razão plausível para isso. Pura, simples e vil traição aos interesses nacionais. As ações da Petrobras são muito bem negociadas nos EUA (o que significa que é forte e tem credibilidade) e ela tem a mesma possibilidade de investir e, se necessário, captar recursos que qualquer grande companhia petrolífera do mundo.
Ponto 4. Comissão mista do Congresso modificou, a pedido de Temer, o texto do projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias para retirar as expressões “distribuição de renda”, “fortalecimento de programas sociais” e “políticas sociais redistributivas”.
Ponto 5. O Estado brasileiro não tem mais uma Constituição efetiva em pontos essenciais.
Decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª. Região no caso Moro afirmou que qualquer juiz pode deixar de aplicar direitos e garantias fundamentais em “situações excepcionais”, embora pensássemos todos nós (inocentes…) que as garantias existissem exatamente para isto, proteger os cidadãos de “situações excepcionais”.
Fundamentou a decisão a doutrina de Carl Schmitt, (“envernizada” por Eros Grau), o teórico que deu suporte à destruição da Constituição de Weimar por Hitler.
Ponto 6. Nenhuma medida atinge a elite do país, aqueles que poderiam de fato arcar com tais ônus. Não se cogita de imposto sobre grandes fortunas, não se cogita de elevar as alíquotas de Imposto de Renda para as faixas de altos salários, não se cogita de uma CPMF, imposto impossível de sonegar para o grande capital, não se cogita de modificar o imposto sobre heranças, praticamente simbólico no país. Todo o ônus recairá sobre a imensa parcela miserável da população.
Ponto 7. Esse conjunto de torpezas destina-se a garantir o pagamento da dívida pública, que ganha preferência absoluta diante das necessidades do povo. Visa assegurar a renda dos especuladores dos títulos públicos, que abocanham cerca de 40% do orçamento da União.
Conclusão 1. O governo brasileiro foi aparelhado por uma quadrilha de canalhas a serviço do grande capital, que, em dois meses, em uma blitz fulminante, está destruindo o Estado, a Constituição e condenando a décadas de sofrimento a maior parte da população para permitir ao grande capital apropriação de renda e patrimônio.
Conclusão 2. É hora de relembrar, mais do que nunca, a frase de Marx no Manifesto Comunista:
“A burguesia, afinal, com o estabelecimento da indústria moderna e do mercado mundial, conquistou para si própria no Estado representativo moderno autoridade política exclusiva. O Poder Executivo moderno não passa de um comitê para gerenciar os assuntos comuns de toda burguesia.”
Conclusão 3. Está insustentável continuar a reduzir a luta social à política institucional e aos parlamentos e persistir na renúncia à organização e conscientização do povo e às reais formas de lutas populares. Está insustentável não denunciar os limites da democracia burguesa e a falácia da “representação política”, esta particularmente abrindo caminho para a barbárie social.
Conclusão 4. Ou morremos de pé ou vivemos de joelhos. Diante desta situação, a única resposta possível é a greve geral. Esta que se anuncia e se prepara; outra, se esta fracassar; e mais outra, e quantas forem necessárias, até que se consiga impedir o genocídio social que se anuncia no Brasil.
As forças e movimentos populares têm uma responsabilidade grave. Deixar-se levar por mesquinharias, conflitos, ressentimentos e pequenos interesses e recusar a unidade será apequenar-se de tal modo que somente lhes restará a lata de lixo da História; porque deles será cobrada a responsabilidade de não travar a luta contra os canalhas. De viver de joelhos em vez de morrer de pé.
Márcio Sotelo Felippe é pós-graduado em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Universidade de São Paulo. Procurador do Estado, exerceu o cargo de Procurador-Geral do Estado de 1995 a 2000. Membro da Comissão da Verdade da OAB Federal.
Viomundo
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