A discussão sobre as intimidades de Lula com Emílio Odebrecht, estranhamente, remeteu-me a um conversa, meses atrás, com meu filho de -agora – 12 anos.
Versava sobre vilões e heróis, no mundo das fantasias em que ele ainda vive e nós, adultos, somos sempre tentados a viver.
O bem e o mal. O certo e o errado.
Quase aos 60, tenho uma vida que não é algo que deseje para qualquer pessoa, não pelo que ela é, mas pelo que ela foi.
Trabalho extenuante, como ainda hoje é, dinheiro curto,embora menos do que sempre foi. Dedicação à política, como sempre será, mesmo que o corpo e a alma, cansados, desejem a folga, os feriados, as licenças que ela não dá.
Nunca fui petista, creio que jamais serei, também.
Mas tento, todos os dias, enxergar a história do meu povo, o que ele sente, o que ele pensa e, sobretudo, o que e quem incorpora seus sonhos de autonomia.
Se algum dia eu o abandonasse, se deixasse de sofrer suas dores, se deixasse de me emocionar com seus sofrimentos, se fizesse pouco de suas carências, eu me consideraria corrompido, ainda que não recebesse um tostão, uma garrafa de vinho ou de uísque que fosse de “meus novos amigos”.
Na conversa com meu filho, nos indagamos se os vilões eram demônios e os heróis eram deuses.
E até uma pequena e inquieta mente alcançou que não, que eram seres humanos e vilão e herói não eram suas condições naturais, eram o que faziam.
Meu avô, de quem falei aqui há tempos, era um pintor de paredes. Virou um cidadão por causa de um estancieiro, um “terrateniente” chamado Getúlio Vargas, que se embebeu de um projeto de nação, e um projeto de nação pressupõe a existência de um povo, não de uma legião de escravos.
Os homens não são o que são, apenas, são aquilo que eles encarnam e representam.
Minha vida adulta foi ao lado de quem, morando na Avenida Atlântica, com o mar de Copacabana diante dos seus olhos, nunca deixou de lado a infância miserável de Carazinho.
Nela, jamais presenciei um ato indigno de traição – erros, certamente muitos – mas vi muitos que se eu conservasse o primarismo dos tolos, seriam o bastante para me afastar. Como entender, por exemplo, que um dos oligarcas brasileiros, Jorge Gerdau Johannpeter, estivesse sempre pronto a colaborar com a atividade política de um trabalhista que contradizia todo o discurso do Lide, de João Dória, onde hoje pontifica?
Talvez, por tudo o que tenha visto passar diante dos meus olhos, a política para mim não tenha se convertido, apesar de ser a atividade de uma vida inteira, em algo semelhante a uma religião.
Recordo da garrafa de Romanée-Conti dos primeiros dias de Lula eleito.
Eu não vivo no mundo dos Romanée Conti, como não vivia no dos Chateauneuf du Pape, que volta e meia Leonel Brizola ganhava.
Não julgo alguém por sua vida pessoal, íntima.
Na política, o julgamento que importa é aquele que se faz por sua vida pública, com governante, como representante de milhões que o sufragaram.
Aprendi com o velho pintor de paredes de Realengo que o julgamento não é moral ou ideológico.
É o que se faz pelo país e por seu povo, para somar ambos em Nação.
Estou muito velho para me tornar udenista, porque sei o que o udenismo fez a este país.
E estou muito jovem para ser udenista, porque ainda sou adepto da liberdade, do direito de cada um viver como quiser, ainda que muito diferente do que eu vivo.
E, por velho e por jovem, aprendi que o que vale, na política, é o que se faz com e para o país.
É isso o que faz vilões e heróis.
Ah, e a propósito, herói acaba sendo aquele que tem meios de nos salvar do desastre.
Porque, como clamava Gláuber Rocha, quase sempre, se o deixam se expressar, “mais fortes são os poderes do povo”
Encarná-los, quem há de?
Tijolaço
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