quinta-feira, 6 de junho de 2019

A cada quatro pessoas assassinadas no Brasil, três são negras



O País registrou 49.524 assassinatos de negros em 2017, um aumento de 62,3% em relação a 2007


De cada quatro pessoas assassinadas no Brasil em 2017, três eram negras, segundo os dados do Atlas da Violência elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A taxa de homicídios para esse grupo da população chegou a 43,1 para 100 mil habitantes, enquanto a dos não negros fechou o ano em 16 por 100 mil.

O Instituto aponta que houve uma piora na desigualdade racial nesse aspecto entre 2007 e 2017, já que a taxa cresceu 33,1% para os negros e 3,3% para os não negros. Apenas entre 2016 e 2017, a taxa de homicídios de negros no Brasil cresceu 7,2%.

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Em números absolutos, o país registrou 49.524 assassinatos de negros em 2017, um aumento de 62,3% em relação a 2007 e de 9,1% ante 2016. Quando são analisados os não negros, os números absolutos tiveram queda de 0,8% em relação a 2016 e alta de 0,4% perante 2007, fechando 2017 em 14.734 mortes.

O coordenador da pesquisa, Daniel Cerqueira, chamou a atenção para o fato de que a desigualdade de crimes sofridos entre negros e não negros está aumentando.

“A gente tem no Brasil uma desigualdade na letalidade por raça que é escandalosa”, disse ele, afirmando que esse dado não chega a ser novo. “E essa boca [distância entre os números de homicídios no gráfico] continua se alargando”.

LGBTI+

O Ipea incluiu pela primeira vez no atlas a violência contra a população de lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis e intersexuais. A avaliação é de que a situação tem se agravado e que a população sofre de invisibilidade na produção oficial de dados e estatísticas. Para o estudo, foram usados dados das denúncias registradas no Disque 100 e de registros administrativos do Sistema de Informação de Agravos de Notificação do Ministério da Saúde.

“Existe um verdadeiro apagão estatístico no Brasil sobre violência contra a população LGBTI”, disse Daniel Cerqueira.

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O número de homicídios denunciados ao Disque 100 subiu de 5 em 2011 para 193 em 2017. Já as lesões corporais aumentaram de 318 em 2016 para 423 em 2017, passando por um pico de 783 casos em 2012.

Para o Ipea, o aumento não se deve apenas à maior divulgação do Disque 100, porque não foi verificado comportamento semelhante nos dados de outras minorias que buscaram o serviço, como idosos, moradores em situação de rua e crianças e adolescentes.

Já os dados do Ministério da Saúde apontam que entre 2015 e 2016 aumentou o número de episódios de violência física, psicológica, tortura e outras violências contra bissexuais e homossexuais, sendo a maioria das vítimas solteiras e do sexo feminino. Já em relação aos autores das violências, 70% eram do sexo masculino. Ao todo, foram notificadas 5.930 situações de violência contra a população LGBTI+.




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Jovens negros são maioria em casos de suicídio no Brasil



Segundo o Ministério da Saúde, a cada dez jovens de 10 a 29 anos que cometem suicídio, seis são negros


Um dado alarmante ilustra a gravidade do racismo na sociedade brasileira: a cada dez jovens (de 10 a 29 anos) que cometem suicídio, seis são autodeclarados negros. O levantamento, do Ministério da Saúde (MS), revela não somente uma disparidade racial, como também a necessidade de políticas públicas mais eficientes para a população negra.

A cartilha Óbitos por Suicídio entre Adolescentes e Jovens Negros, lançada pelo MS, mostra que entre 2012 e 2016 o número de casos com pessoas brancas permaneceu estável, enquanto o das negras aumentou 12%. “É curioso saber que esse aumento acontece em um contexto que nos leva a pensar em quais formas a população negra tem se organizado diante do racismo”, contesta a psicóloga Mônica Gonçalves, que estuda relações raciais e atua no campo de pesquisa da Saúde Pública. Para ela, o racismo é uma condição social que unifica todos os negros e, por isso, não seria possível saná-lo com uma única política reparatória, o que torna necessária a articulação de diferentes ações interseccionais.

A psicóloga conta que durante os quatro anos e meio em que trabalhou no Sistema Único de Saúde (SUS) atendeu inúmeras pessoas pretas, mas apenas uma delas tocou no assunto racismo: uma pré-adolescente que sentia vergonha da cor da pele, do cabelo e sofria bullying na escola. A explicação para tal silêncio não significa, segundo Gonçalves, a isenção da opressão nas vidas destas pessoas, e sim uma divergência de classes influente nos métodos de combate ao sofrimento. Ela explica dizendo que quando trabalha em clínicas costuma receber muitas queixas de racismo, “muitos já vêm por um endereçamento, sabendo que sou negra e estudo o assunto”.



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Instituída em 2009, a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra visa garantir a equidade e a efetivação do direito à saúde de negras e negros. Contudo, ela ainda é pouco aplicada nos equipamentos de saúde do Estado. Prova disto é que, segundo um levantamento da Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo, somente 57 municípios brasileiros, dentre os mais de 5 mil existentes no país, a colocaram em prática. “É uma política importante, de caráter reparatório que reconhece o racismo institucional. Por ser integral significa que ela deveria ser implementada em todas as esferas das instâncias do SUS, desde a atenção primária até a alta complexidade.”, defende Gonçalves.

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O Ministério da Saúde mostra que em 2016 o risco de um jovem negro cometer suicídio foi de 45%. O número, demasiadamente alto, pode ser ainda maior. O professor e psicólogo Paulo Navasconi relembra que os dados são muitas vezes subnotificados e que alguns estudos estimam o triplo das quantidades divulgadas.

Navasconi é autor do livro “Vida, Adoecimento e Suicídio”, que aborda a negligência da literatura científica quanto à interseccionalidade dos marcadores de raça, classe e gênero, e os efeitos político-científicos desse silenciamento. A obra aborda, através de uma perspectiva da psicologia, conceitos como epistemicídio, colonialidade do saber, dispositivo de racialidade, racismo epistêmico, branquitude e heteronormatividade.


DIVULGAÇÃO


“Se eles [negros] não são mortos pela mão do estado, são mortos na mão de uma sociedade deliberadamente racista. O racismo estrutural é um determinante de saúde e direitos.”, afirma o autor.

Pesquisas recentes vêm apontando que o suicídio é uma prática multifatorial, isto é, acontece por questões econômicas, sociais, biológicas e culturais. “Por que não enxergamos a raça como um determinante de saúde? O racismo afirma e reafirma que corpos negros são inferiores, feios e incapazes. É como aquela frase ‘eu me faço a partir do olhar do outro’, de que modo esse outro me olha?”, questiona Navasconi.
Números desiguais

A desigualdade racial é evidenciada em diferentes pesquisas e estudos científicos, sendo possível identificá-la em todos os campos sociais, culturais e econômicos. Tomemos como exemplo alguns dados:

O terceiro trimestre de 2018 registrou a taxa de desemprego maior entre pessoas pardas (13,8%) e pretas (14,6%).(Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – PNAD).
No quarto trimestre de 2018, as pessoas que se declararam brancas tiveram rendimento mensal médio de R$ 5.416, já os os pardos de R$ 2.467 e os negros de R$ 1.746. (Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – PNAD).
A taxa de analfabetismo entre pretos e pardos em 2017 foi 9,9%, enquanto a de brancos foi menos que a metade (4,2). (Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE).
A cada quatro pessoas assassinadas pela polícia no Brasil, três são negras, o que representa 76,2% do total. (Fonte: Fórum Brasileiro de Segurança Pública)

O suicídio

Na tentativa de romper com sofrimentos, sobretudo mentais, muitas pessoas acabam com a própria vida. Segundo a Organização Mundial da Saúde, cerca de 800 mil suicídios acontecem por ano e essa é a segunda principal causa de morte entre jovens com idade entre 15 e 29 anos. Navasconi acredita que para solucionar esta questão é preciso, principalmente, falar sobre projeto de vida. “Penso que nas estratégias mais práticas precisamos de ações nas escolas, nos programas de saúde e monitoramento da efetivação das ações”, defende. 

O Centro de Valorização da Vida (CVV) é uma associação civil sem fins lucrativos que trabalha com a prevenção do suicídio. Qualquer pessoa pode conversar, sob total sigilo por telefone, email e chat 24 horas todos os dias. Os voluntários recebem treinamento e não precisam ter formação em psicologia.

Carta Capital

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